A ideia de classificar as plantas de acordo com as condições ambientais do seu habitat foi proposta em 1807 pelo naturalista Alexander von Humboldt.[4] O botânico Eugenius Warming tentou aplicar a ideia (cunhou a expressão formas de vida botânicas nessa ocasião), mas a sua classificação, publicada em 1884, é confusa.
Nessa linha de pensamento, o sistema de categorização das plantas com flor baseado na posição em relação ao solo das gemas de renovo da planta, complementado por alguns aspectos da morfologia da planta na sua fase adulta, foi inicialmente proposto pelo biólogo dinamarquês Christen C. Raunkiær numa conferência por ele proferida em 1904 na Sociedade Botânica de Copenhaga (Botaniske forening i København), com um sumário publicado no periódico daquela Sociedade, o Botanisk Tidsskrift (vol. 25-26, 1903-1905).[5]
Uma versão mais alargada da classificação apareceu em língua francesa no ano seguinte (1905).[6] Nos anos imediatos Raunkiær aprofundou o seu sistema de classificação, publicando uma versão melhorada, em língua dinamarquesa, em 1907.[7][8] A versão completa da classificação surgiu em 1934, já com os traços globais do sistema presentemente utilizado.[9] A nota inicial e o artigo de 1907 apenas foram traduzidos para inglês e tiveram expansão internacional muito mais tarde, após terem sido incluídos na colectânea dos artigos de C. Raunkiær sobre formas de vida das plantas.[2][8][10]
O sistema de categorização inicialmente proposto por Raunkiær foi subsequentemente revisto e modificado por vários autores,[3][11][12] mas a sua estrutura principal sobrevive e é consensual.
Sistema de categorização
As categorias utilizadas para estabelecer as subdivisões de Raunkiær estão baseadas na posição das gemas de renovo durante a estação climática mais desfavorável para as plantas (estação fria ou seca, consoante o tipo de clima). O sistema de «tipos biológicos» consiste em três grandes categorias (plantas perenes ou vivazes; plantas anuais; e plantas bienais) divididas em classes:
Plantas perenes (vivazes)
Persiste pelo menos uma parte do aparelho vegetativo durante a estação desfavorável.
Fanerófitos (do grego φανερός, phaneros, «aparente» e φυτόν, phyton, «planta») — plantas que projectam os caules para o ar, mantendo as suas gemas expostas ao ar durante a estação desfavorável. Inclui as espécies vivazes (duram mais de um ano), geralmente lenhosas, com as gemas de renovo a uma altura acima do solo de pelo menos 25 cm (arbustos e árvores, mas inicialmente também epífitas, posteriormente separadas num grupo específico).
Em função da altura, esta categoria inclui as seguintes subcategorias:.[13]
Nanofanerófito — o caule lenhoso não ultrapassa 0,5 m de altura
Microfanerófito — o caule lenhoso tem entre 0,5 e 2 m de altura;
Mesofanerófito — o caule lenhoso tem entre 2 e 8 m de altura;
Megafanerófito — o caule lenhoso ultrapassa os 8 m de altura.
Outras características utilizadas para subdividir o grupo (criando 12 subcategorias):
Caméfitos (do grego χαμαι, khamai, «à terra», e φυτόν, phyton, «planta») — plantas essencialmente lenhosas com as gemas de renovo muito próximas do solo (altura inferior a 25 cm acima do solo). Entre os caméfitos, distinguem-se:
Caméfitos frutescentes — arbustos, mais ou menos erectos;
Caméfitos herbáceos — ervas, mais próximas do solo.
Hemicriptófitos (do grego ἡμι, hemi, «metade», κρυπτός, kryptos, «escondido», e φυτόν, phyton, «planta») — vegetais herbáceos, vivazes ou bienais, que perdem a biomassa aérea na estação desfavorável. As gemas estão junto ao solo protegidas por detritos orgânicos. São reconhecidas as seguintes subcategorias:
Protohemicriptófitos — com apenas folhas caulinares;
Hemicriptófitos parcialmente rosulados — com folhas caulinares e folhas da roseta basal;
Hemicriptófitos rosulados — com apenas folhas na roseta basal;
Hemicriptófitos cespitosos — com múltiplos caules emergindo do solo;
Criptófitos (ou geófitos, do grego γῆ, gê, «terra», e φυτόν, phyton, «planta») — as gemas de renovo estão enterradas no solo, associadas a rizomas, cormos, bolbos ou estruturas similares, ou são gemas subaquáticas. Subdividem-se em três grupos:
Helófitas (do grego ἑλώς, helos, «pântano», e φυτόν, phyton, «planta»), limnocriptófitas ou limnófitas — as gemas de renovo ficam enterradas no lodo (ou pelo menos imersas), as folhas ficam pelo menos parcialmente emersas. Plantas típicas das zonas pantanosas e das águas rasas (por exemplo Typha e Phragmites);
Hidrófitas (do grego ὕδριος, hudrios, «aquático», e φυτόν, phyton, «planta») ou hidrocriptófitas — as gemas dormentes e as folhas ficam submersas (por exemplo as Nymphaeaceae).
Plantas anuais
Plantas que atravessam a estação desfavorável sob a forma de sementes:
Terófitas (do grego theros, «estação», e phyton, «planta») — plantas anuais que passam a estação desfavorável sob a forma de sementes. Este grupo completa rapidamente o seu ciclo de vida, sobrevivendo aos períodos desfavoráveis como sementes incluídas no banco de sementes do solo. A maioria das plantas dos desertos são terófitos.
Plantas bienais
A planta desenvolve-se em dois ciclos anuais consecutivos.
Plantas com epifitismo ou que obtém a água e os nutrientes da humidade do ar e da precipitação atmosférica.
Epífitas — são plantas vivazes, muitas vezes lenhosas, que crescem sobre outras plantas. Foram inicialmente colocadas entre as fanerófitas, mas foram separadas dada a irrelevância da posição das gemas em relação ao solo (pois estão instaladas sobre outras plantas).
Aerófitas — foi uma categoria posteriormente adicionada à classificação de Raunkiær[14] para acomodar as plantas que obtém a água e os nutrientes a partir da humidade do ar e da chuva. Estas plantas são geralmente epífitas, mas não são parasitas nem dispõem de raízes funcionais. São em geral plantas perenes cujas raízes ficam atrofiadas. Algumas vivem em dunas de areias móveis. Como as epífitas e hemicriptófitas, as suas gemas estão próximo da superfície. Este grupo inclui algumas espécies do género Tillandsia.
Lianas e trepadeiras
Plantas que apenas se mantêm erectas se apoiadas noutras plantas ou suportes.
Lianas (ou cipós) — crescem agarradas a outras plantas ou umas nas outras através de um sistema radicular adaptado.
Aplicação generalizada dos tipos biológicos de Raunkiær
Fanerófitas
As fanerófitas (P) são plantas perenes e lenhosas, com gemas de renovo (meristemas vegetativos) localizadas a uma altura superior a 25 cm acima do solo. A distância ao solo varia, consoante os autores e as zonas climáticas, entre 25 cm, 30 cm, 50 cm e mesmo 1 m. São subdivididas nas seguintes categorias:
As fanerófitas epífitas (P ep) são plantas lenhosas que crescem sobre outras plantas, que usam como suporte mecânico, não mantendo relação directa com o solo (as suas raízes, quando existam, não chegam ao solo).
Exemplo: Viscum album L.
Os caméfitos (Ch) são plantas perenes e lenhosas na base com gemas de renovo localizadas entre 2 cm e 25 cm acima do solo. São subdivididos nas seguintes categorias:
Os caméfitos escaposos (Ch scap) são plantas cuja parte aérea consiste maioritariamente num escapo ou estrutura que a ele se assemelha. Em geral apresentam um eixo floral alongado, desprovido de folhas.
Exemplos: Stellaria holostea
Os hemicriptófitos (H) são plantas herbáceas, bienais ou perenes, com gemas de renovo situadas ao nível do solo que atravessam a estação desfavorável protegidas pela manta morta, areia, neve ou outros materiais soltos. São subdivididos nas seguintes subcategorias:
Os geófitos (G) são plantas perenes herbáceas cujas gemas de renovo estão colocadas abaixo da superfície do solo. Durante a estação mais desfavorável não apresentam órgãos vegetativos aéreos e as gemas permanecem em órgão subterrâneos, como bolbos, tubérculos e rizomas. São subdivididos nas seguintes categorias:
Os geófitos parasitas (G par) são plantas perenes com gemas de renovo subterrâneas ligados a órgãos específicos capazes de se nutrir da seiva das plantas cujas raízes parasitam.
Exemplos: Monotropa hypopitys
As hidrófitas (Ho) são plantas aquáticas perenes cujas gemas de renovo se encontram submersas ou flutuantes. São relativamente pouco comuns e alguns autores incluem estas plantas numa subcategoria da categoria dos geófitos. São subdivididas nos seguintes grupos:
Os terófitos (T) são plantas herbáceas anuais que diferem das restantes formas biológicas por, sendo anuais, atravessarem a estação adversa sob a forma de sementes. São subdivididas em:
↑ abCh. 1 in Raunkiær (1934): Biological types with reference to the adaption of plants to survive the unfavourable season, p. 1.
↑ abEllenberg. H. & D. Mueller-Dombois (1967). A key to Raunkiaer plant life-forms with revised subdivisions. Ber. Goebot. Inst. ETH. Stiftg Rubel. Zurich. 37:56-73, [1].
↑A. von Humboldt, Essai sur la géographie des plantes, Ed. européennes Erasme, 1807
↑C. Raunkiær, Om biologiske typer, med Hensyn til Planternes Tilpasning til at overle ugunstige Aarister. Bot. Tidsskrift, 26., 1904
↑Raunkiær, C. (1907) Planterigets Livsformer og deres Betydning for Geografien. Gyldendalske Boghandel - Nordisk Forlag, København and Kristiania. 132 pp., (PDF).
↑ abCh. 2 in Raunkiær (1934): The life-forms of plants and their bearings on geography, p. 2-104.
↑C. Raunkiær, The Life Forms of Plants and Statistical Plant Geography, being the collected papers of C. Raunkiær., Oxford University Press, 1934, p. 2-104.
↑Raunkiær, C. (1934) The Life Forms of Plants and Statistical Plant Geography, being the collected papers of C. Raunkiær. Translated by H. Gilbert-Carter, A. Fausbøll, and A. G. Tansley. Oxford University Press, Oxford. Reprinted 1978 (ed. by Frank N. Egerton), Ayer Co Pub., in the "History of Ecology Series". ISBN 0-405-10418-9. Nota: Não estão incluídas todas as publicações de Raunkiaer, a colectânea apenas inclui os artigos sobre formas de vida das plantas e sobre geografia.
↑Müller-Dombois, D. & H. Ellenberg (1974) Aims and methods in vegetation ecology. John Wiley & Sons, New York. Reprint 2003, Blackburn Press, ISBN 1-930665-73-3
↑Shimwell, D.W. (1971) The Description and Classification of Vegetation. Sidgwick & Jackson, London. ISBN 9780283980633
↑C. Raunkiær, The Life Forms of Plants and Statistical Plant Geography, being the collected papers of C. Raunkiær., Oxford University Press, 1934, p. 2-104.
Christen C. Raunkiær, The Life Forms of Plants and Statistical Plant Geography, Oxford, Oxford University Press., 1934.
H. Ellenberg, D. Mueller-Dombois, "A key to Raunkiaer plant life forms with revised subdivision", in Ber. Geobotan. Inst. E.T.H., Stiftung Rubel., vol. 37, 1967, pp. 56–87.