Em nota sobre o folheto João Grilo, um Presepeiro no Palácio, de Pedro Monteiro, Marco Haurélio propõe uma hipótese para a origem de João Grilo, personagem conhecido dos leitores de cordel e protagonista da peça Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna:
“A história do adivinhão que se vale mais da sorte do que da astúcia, ao menos na primeira parte da narrativa, vem da mesma seara onde Câmara Cascudo recolheu Adivinha, adivinhão, arrolado entre os Contos tradicionais do Brasil. O motivo central chegou-nos de Portugal, embora seja corrente na tradição oral de vários países, como Itália, França, Noruega e até mesmo a distante Mongólia. Ainda no Brasil, temos O velho e o tesouro do rei, dos Contos populares do Brasil, de Silvio Romero, e O Dr. Grillo, dos ‘’Contos da Carochinha’’ do pioneiro Figueiredo Pimentel. As ocorrências são muitas, incluindo até uma variante alagoana, Estória de João Grilo, recolhida e divulgada por Théo Brandão, em 1954. O adivinhão do título do folheto de Pedro Monteiro é o João Grilo de incontáveis histórias de cordel, a começar pelo clássico Proezas de João Grilo, de João Ferreira de Lima, publicado originalmente como Palhaçadas de João Grilo, em 1932. Personagem encontradiço nos contos populares portugueses, nas coleções de Consiglieri Pedroso (História de João Grilo) e Teófilo Braga (João Ratão ou Grilo), a menção mais antiga que conheço é da introdução do Pentamerone, de Giambattista Basile (1634-36). Basile nos fala de passagem de certo Maestro Grillo, protagonista de uma obra cômica, Opera nuova piacevole da ridere de um villano lauratore nomato Grillo, quale volse douentar medico, in rima istoriata (Veneza, 1519). Grillo, fingindo-se de médico, faz com que uma princesa sisuda ria pela primeira vez. Angelo de Gubernatis, na Mitologia zoológica, segundo Teófilo Braga, afirma: “Na Itália, quando se propõe um enigma para ser adivinhado, ajunta-se ordinariamente como conclusão as palavras – Indovinala, grillo! (adivinha, grilo)”. Orientalista, Gubernatis, fazendo coro aos estudiosos de seu tempo, associa a expressão ao idiota fingido que acaba por revelar-se esperto, interpretando-o como o sol que, mesmo envolvido na nuvem, ou durante a noite, a tudo vê. Um evidente exagero. Mas a expressão popular vem ao encontro do João Grilo adivinhão que figura, além do folheto de Pedro Monteiro, na última parte das Proezas de João Grilo.”[3]