Roberto Porta
Roberto Porta (Montevidéu, 7 de junho de 1913 — Buenos Aires, 2 de janeiro de 1984) foi um futebolista que atuava como ponta-direita, e depois treinador uruguaio. Foi o técnico de seu país na Copa do Mundo de 1974, a primeira em que a Celeste convocou quem atuasse no exterior.[1] Ex-jogador das seleções italiana (uma partida) e uruguaia (34 jogos), nessa ordem,[2] Porta foi por décadas o único futebolista sul-americano a defender primeiramente uma seleção europeia antes de jogar por uma da América do Sul, e um dos dois únicos com tal trajetória, ao lado do alemão Marius Hiller (que depois de defender a terra natal jogou pela Argentina).[3] O terceiro caso veio a se dar em 2018, quando Franco Vázquez, jogador da seleção italiana até 2015, adotou a a da Argentina natal.[4] Ídolo no Nacional, equipe que contou com diversos destacados familiares seus, Porta foi também um dos primeiros uruguaios a atuar profissionalmente no futebol argentino, onde defendeu o Independiente. No Nacional, destacou-se especialmente no elenco que conseguiu o primeiro pentacampeonato na história do campeonato uruguaio, no chamado Quinquenio de Oro,[5] bem como por ajudar o clube a manter ou trazer quem se tornaria seu maior artilheiro, Atilio García,[6] assim como o jogador que por muito tempo foi o recordista de partidas, o goleiro nove vezes campeão uruguaio Aníbal Paz.[7] Família e origensPorta é familiar de alguns destacados jogadores uruguaios de seu tempo, todos vinculados ao Nacional. Era sobrinho de Abdón Porte,[5] célebre por ter se suicidado em 1918 no círculo central do estádio do clube após deprimir-se por perder lugar entre os titulares, ato até hoje homenageado em bandeiras da torcida.[8] Posteriormente, Porta, através da irmã Dora, tornou-se cunhado de Ricardo Faccio, de quem foi colega na equipe e que era apelidado de Ricardo Coração de Leão.[5] Tal como Porta, Faccio também defendeu as seleções de Uruguai e Itália.[3] Filho dele e sobrinho de Porta, Juan Faccio passou pelas três principais equipes do país: no Nacional e na seleção (juvenil) como jogador e no Peñarol como técnico. Ele e Porta apresentaram versões divergentes para as origens em comum: Porta declarava que o tio Abdón Porte teve o sobrenome grafado assim devido a um erro do registro público. Já Juan, em livro publicado em 2012 dedicado aos ídolos do Nacional, apresentou ao autor uma versão inversa: "nós não somos Porta nem italianos. Somos bascos e Porte. Ficou Porta porque anotaram mal", apesar de Porta ter conseguido jogar pela Itália.[5] Carreira em clubesInícios no NacionalPorta chegou ao time juvenil do Nacional ainda no início da adolescência no que lhe representou uma grande emoção. Sua família acompanhava o clube em função do tio Abdón Porte, já falecido:
A estreia no time adulto veio ainda aos 15 anos, em 1929. Foi em amistoso contra a seleção francesa, que visitava Montevidéu para conhecer o país, sede dali a um ano da primeira Copa do Mundo. O ponta-direita titular era Santos Urdinarán, dispensado da partida em função do falecimento da mãe. O próprio presidente do clube, Atilio Narancio, veio ao pai de Porta pedir-lhe autorização para a escalação do jovem. A França ganhou por 3-2, mas Porta teve uma boa exibição. O astro Héctor Scarone passou a defender sua escalação, ocasionalmente no lugar até dele mesmo.[5] A estreia oficial em jogos competitivos só se deu em 1930, no Torneio José Serrato, uma vez que não houve naquele ano o campeonato uruguaio em função da Copa do Mundo no país - para a qual chegaria a ser pré-convocado. A estreia ocorreu em função de uma doença de Scarone. Porta estava atuando como zagueiro em jogo do time de aspirantes quando foi convidado às pressas para sair da partida e se preparar para enfrentar o Olimpia de Montevidéu, para repor a ausência do astro.[5] No exteriorEm 1931, foi, junto com o colega Enrique Fernández, jogar no Independiente.[5] Foi o ano inaugural do campeonato argentino profissional.[9] Marcou gol inclusive no primeiro Clássico de Avellaneda da era profissional, vencido naquele campeonato por 7-4 pelo Racing, no que é até hoje o dérbi com mais gols pelo torneio argentino.[10] Em 1932, o Independiente terminou o campeonato empatado na liderança com o River Plate, que terminou campeão ao vencer por 3-0 o jogo extra. Porta foi um dos titulares do Rojo,[9] vice em campanha marcada pelos altos investimentos do oponente, incluindo a transferência que foi por décadas a contratação mais cara a nível mundial do futebol, a de Bernabé Ferreyra.[11] Porta ficou no Independiente até agosto de 1934, quando embarcou rumo à Internazionale.[5] Foi o primeiro profissional uruguaio a se destacar em uma equipe marcada por ter sucesso com jogadores do país vizinho, tais como Juan Carlos Corazzo (seu colega no clube), Antonio Alzamendi, Ricardo Pavoni ou Diego Forlán. Quando a equipe completou sem centenário oficial em 2005, Porta foi lembrado como "um sócio ideal para os gênios do amadorismo e do profissionalismo (...). Ao Rojo doou dribles e gols pela ponta-direita. Gritou 18 vezes em 87 partidas".[12] Sua boa acolhida na Argentina foi preponderante para que ele anos depois fizesse questão de manter o argentino Atilio García no Nacional após este, em sua estreia, não ter feito um bom primeiro tempo e ensejasse pedidos de substituição pelos cartolas. García posteriormente se converteria no maior artilheiro do clube.[6] Porta foi jogar na Internazionale, então chamada Ambrosiana, que já havia contratado o cunhado Ricardo Faccio. Em duas temporadas no calcio, conseguiu no máximo um vice-campeonato na Serie A,[5] não ficando muito marcado entre os uruguaios de mais sucesso no futebol italiano.[13] Mas na época conseguiu uma convocação à seleção italiana campeã de 1935 da Copa Dr. Gerö, espécie de precursora da Eurocopa, travada entre países da Europa Central.[5] A consagração no NacionalMuitos jogadores estrangeiros de origem italiana haviam deixado o país com a eclosão da Segunda Guerra Ítalo-Etíope, em 1935, temerosos de convocações às Forças Armadas da Itália.[14] Porta retornou ao Uruguai em 1936, voltando ao Nacional.[5] No ano seguinte, enfim estreou pela seleção uruguaia.[2] Em tempos em que era incomum jogadores terem carro próprio,[7] ele ia para a sede do clube a cavalo, então um meio de transporte comum em Montevidéu.[5] No Nacional, seu primeiro título como titular veio em 1938, no primeiro Torneio Noturno Rio-Pratense. Envolveu as melhores equipes de Montevidéu, Grande Buenos Aires, La Plata e Rosário, com o Nacional garantindo a conquista com duas rodadas de antecedência, em campanha lembrada pela exibição de camisas ensanguentadas após vitória por 2-1 fora de casa sobre o Estudiantes. O capitão ainda era o cunhado Ricardo Faccio, também de volta ao Uruguai.[15] O campeão uruguaio daquele ano foi o rival Peñarol, que por outro lado só ganhou um e perdeu três dos cinco clássicos realizados naquele ano, marcado também pela vinda do argentino Atilio García,[16] maior artilheiro do Nacional e do grande clássico uruguaio. O dirigente Atilio Narancio, o mesmo responsável pela primeira escalação de Porta no futebol adulto,[5] havia contratado García junto ao Boca Juniors em função da coincidência de nomes, segundo o folclore.[6] García não tinha espaço no Boca e fez um primeiro tempo ruim em sua estreia no Nacional, em amistoso contra o Chacarita Juniors. Porta intercedeu pela manutenção do estreante para o segundo tempo, notando-lhe grande vontade, García faria dois gols e não sairia mais, sendo fundamental já no Torneio Noturno.[6] Esse torneio foi considerado o pontapé para o Quinquenio de Oro, o primeiro elenco a ser pentacampeão seguido no campeonato uruguaio.[16] O primeiro desses títulos veio no campeonato de 1939, finalizado em jogo-extra com o Peñarol já no ano seguinte. Foi o campeonato em que estreou o goleiro Aníbal Paz,[17] por muito tempo o recordista de partidas pelo Nacional e recomendado ao clube pelo próprio Porta, de quem era colega na seleção.[7] Pelo campeonato próprio de 1940, o ataque-base mais famoso do Quinquenio já estava perfilado: Luis Volpi na ponta-direita, Aníbal Ciocca na meia-direita, Atilio García como centroavante, Porta na meia-esquerda, com Enrique Castro e Bibiano Zapirain alternando-se na ponta-esquerda. A conquista se garantiu com goleada de 5-1 no clássico com o Peñarol, marcado pelos quatro gols de García, ainda um recorde individual em um só dérbi. O time também foi campeão da Copa Ricardo Aldao, tira-teima com o campeão argentino (o Boca Juniors) para definir a melhor equipe do Rio da Prata.[18] Já o título de 1941 foi histórico: o clube venceu todos os seus vinte jogos, algo provavelmente único em um campeonato profissional de uma potência do futebol. E essa campanha incluiu a maior goleada da história da rivalidade principal do país, um 6-0 sobre o Peñarol. Ficou conhecido como "o dia do 10-0", pois no mesmo dia houve partida prévia entre os quadros reservas de ambos os clubes, com o Nacional ganhando por 4-0. No 6-0, os chutes violentos de Porta foram decisivos no segundo e no sexto gol; no segundo, propiciou um rebote aproveitado por García. No sexto, o próprio Porta marcou, após iniciar a jogada em troca de passes com Luis Ernesto Castro, o novo titular na ponta-direita.[19] A equipe campeã com 100% de aproveitamento foi a base da seleção uruguaia campeã da Copa América de 1942.[16] O título de 1942 incluiu nova goleada no clássico, por 4-0, no qual Porta participou especialmente no terceiro gol, aos 43 minutos do primeiro tempo, concluindo um chute forte rebatido por Roque Máspoli, permitindo que García aproveitasse para cruzar para Zapirain marcar.[20] O clube também ganhou nova Copa Ricardo Aldao, com o River Plate sendo derrotado por 4-0 mesmo possuindo o célebre elenco apelidado de La Máquina.[21] Porta fez o último gol.[20] O Quinquenio foi finalizado com nova vitória sobre o Peñarol, o 3-1 em novembro de 1943. Foi a décima vitória tricolor seguida na rivalidade, sequência de vitórias jamais igualada no clássico. Porta foi um dos sete jogadores presentes em todo o Quinquenio, ao lado de Ciocca, Eugenio Galvalissi, Atilio García, Aníbal Paz, Luis Volpi e Luis Pérez Luz.[22] Deles, somente Porta e García estiveram no título seguinte, que só viria em 1946, vencendo-se também, outra vez, a Copa Ricardo Aldao, contra o San Lorenzo.[23] Porta encerrou a carreira no ano seguinte.[5] SeleçõesPorta foi pré-convocado à Copa do Mundo FIFA de 1930 pelo anfitrião Uruguai, mas a chamada final não se concretizou.[5] Só defenderia pela primeira vez a Celeste Olímpica anos mais tarde, pois logo foi jogador fora do país, o que impedia a convocação até o início da década de 1970.[1] Sua primeira partida por uma seleção deu-se defendendo a Itália. Jogou uma única vez pela Azzurra, em empate em 2-2 contra a Hungria em Milão em 24 de novembro de 1935, pela Copa Dr. Gerö.[2] A Itália terminaria campeã do torneio, precursor da Eurocopa.[5] De volta ao Uruguai em 1936, estreou pela seleção em 10 de outubro de 1937, em derrota de 3-0 para a Argentina em Montevidéu pela Copa Newton.[2] O Uruguai recusaria tomar parte da Copa do Mundo FIFA de 1938, oficialmente ainda em retaliação pela larga ausência das potências europeias na edição de 1930.[24] Em função da Segunda Guerra Mundial, não haveria edições do torneio na década de 1940. Os jogos de Porta pela Celeste assim se limitaram à Copa América e outros troféus pelo continente.[2] A primeira Copa América de Porta foi a de 1939. Nela marcou seu primeiro gol em jogos de seleções, no 6-0 sobre o Equador,[2] abrindo o placar aos 22 minutos do primeiro tempo na estreia do Uruguai. Também marcou gols no 3-1 sobre o Paraguai e na derrota de 2-1 para o Peru, ambos os últimos das partidas. Porta ficou em terceiro na artilharia, mas o título ficou com o próprio Peru, em função do embate direto na última rodada.[25] Por outro lado, admirou-se tanto do goleiro Aníbal Paz, do Bella Vista, que o recomendou ao Nacional. Paz tornar-se-ia por muito tempo o recordista de partidas no clube.[7] Porta voltou a participar na edição de 1941. Voltou a marcar um gol em outro 6-0 sobre o Equador,[2] novamente o adversário da estreia. Dessa vez, foi o quarto gol, em dia em que também perdeu um pênalti. Os uruguaios foram novamente vice-campeões, agora para a Argentina.[26] O título veio na edição de 1942,[27] a de melhor retrospecto de Porta também individualmente, com cinco gols.[2] Fez o quinto no 6-1 no Chile, o quarto e o último no 7-0 no Equador (todos os gols, no primeiro tempo), o segundo no 3-1 sobre o Paraguai e o último no 3-0 sobre o Peru. O título se garantiu contra a Argentina. Do quinteto ofensivo uruguaio, somente Severino Varela não era do Nacional.[27] Seu último jogo pelo Uruguai também foi contra a Argentina em Montevidéu e igualmente pela Copa Newton, em derrota por 6-2, em 15 de agosto de 1945. Havia participado pela quarta vez da Copa América, naquele mesmo ano, marcando três vezes nela:[2] o segundo na vitória por 5-1 sobre o Equador, o sexto no 7-0 sobre a Colômbia e o segundo no 2-0 sobre a Bolívia. Dessa vez, o Uruguai contava em sua seleção com o argentino Atilio García, vice-artilheiro da competição,[28] mas com desempenho considerado afetado pelos diversos xingamentos de "traidor" proferidos nas escalas pelo interior argentino rumo ao Chile, onde ocorreu o torneio.[6] O Uruguai terminou somente em quarto.[28] Porta foi titular em 33 das 40 partidas disputadas pelo Uruguai entre 1937 e 1945. A Segunda Guerra Mundial, porém, impediu que disputasse a Copa do Mundo FIFA na década de 1940.[5] O uruguaio ainda é o único jogador sul-americano que defendeu primeiramente uma seleção europeia antes de jogar por uma sul-americana. Somente o alemão Marius Hiller, que defendeu na ordem a Alemanha e a Argentina, teve a mesma trajetória.[3] Como treinadorComo técnico, Porta treinaria a seleção uruguaia na Copa do Mundo FIFA de 1974, mas a sua experiência de técnico internacional termina juntamente com a eliminação precoce de sua seleção naquele Mundial,[29] embora sua formação na época fosse considerada a mais forte que o país haviam produzido em anos.[30] O torneio marcou a primeira vez em que o Uruguai permitiu a convocação de jogadores que estavam no exterior, como Ricardo Pavoni (Independiente) e Pedro Rocha (São Paulo), que decidiram a Taça Libertadores da América de 1974. A medida, porém, também teve um efeito negativo, provocando um racha na seleção, com os jogadores "nativos" descontentes - alguns destes, como Fernando Morena, vinham recusando ofertas da Europa imaginando que somente assim se manteriam na seleção.[1] Referências
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