O contexto da oração em Mateus é uma parte de um discurso, sobre um povo sofrido que ora grandiosamente, simplesmente com a finalidade de ser visto orando; Mateus descreve Jesus ensinando as pessoas a orar "segundo a fórmula" dessa oração. Tendo em conta a estrutura da oração, fluxo de sujeito e ênfases, uma interpretação da Oração do Senhor é como uma orientação sobre como orar em vez de aprender algo ou repetir por hábito. Há outras interpretações sugestivas que a oração foi concebida como uma oração específica a ser usada. O Novo Testamento relata Jesus e seus discípulos orando em várias ocasiões; mas nunca os descreve usando essa oração, é incerto o quão importante ela foi originalmente vista e tida.
Seja feita a vossa vontade, assim na terra como no Céu.
O pão nosso de cada dia nos dai hoje.
Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido.
E não nos deixeis cair em tentação.
Mas livrai-nos do mal. Amém
Na Páscoa de 2007, foi estimado que dois bilhões de cristãoscatólicos, protestantes e ortodoxos leram, recitaram ou cantaram a oração em milhares de línguas.[9] Embora muitas diferenças teológicas e vários modos e maneiras de adoração dividam cristãos, de acordo com o professor Clayton Schmit do Seminário Fuller "há um senso de solidariedade em saber que os cristãos ao redor do globo estão orando juntos..., e estas palavras sempre nos unirão."[9]
A Bíblia do Peregrino, por meio de Nota de Rodapé a Mateus 6:13, observa que essa oração ressoa a experiência de Israel no processo de sua libertação, o que inclui: provações no deserto, o maná cotidiano, a vontade de Deus promulgada como Lei, a santidade cultual do nome de Deus revelada por Moisés e o reinado de Deus pela aliança na Terra Prometida.
assemelha-se tanto pelo conteúdo como pela forma à "Oração das Dezoito Preces", que os judeus rezam ainda hoje, mas que se distingue, em primeiro plano, pela simplicidade e pela liberdade como Deus é invocado, além disso a ordem das petições é diferente e característica do ensinamento de Jesus;
tem em seu início uma prece tríplice que tem como ápice um apelo à intervenção de Deus para o advento de seu Reino;
depois tem lugar uma série de petições que exprimem as necessidades essenciais dos discípulos;
o emprego da primeira pessoa do plural dá um caráter comunitário à oração;
na versão apresentada no Evangelho segundo Mateus há sete petições, enquanto que na versão apresentada no Evangelho segundo Lucas contém apenas cinco petições, e que seria impossível dizer qual a versão mais antiga, devendo ambas as formas terem sido empregadas em comunidades cristãs primitivas;
existem dificuldades para oferecer a tradução dessa prece para uma língua moderna, a compreensão de certas expressões exigiria um bom conhecimento do Antigo Testamento e do judaísmo antigo, razão pela qual as traduções literais nem sempre seriam as melhores.
O Pai-Nosso na Igreja Primitiva
Deve-se observar que Jesus viveu no contexto da espiritualidade judaica, que nos evangelhos se cita frequentemente os textos sagrados do judaísmo e que Jesus, como judeu, estava sob a Torá. Seguramente orou as Dezoito Bençãos, o Shema, o Avinu Malkenu (Pai nosso, Rei nosso), os Salmos, o Tehilim ("louvores" em português), entre outras muitas orações que existiam dentro do corpo religioso judaico.
Pode-se assegurar que, se o judaísmo introduziu uma grande novidade no contexto religioso de sua época, o cristianismo trouxe ao mundo de seu tempo uma nova visão da Divindade. Para o cristianismo existia uma deidade, a dos judeus. Só havia um Deus verdadeiro, mas não para um só povo. O Senhor passou de ser um Deus local do povo judeu para ser um Deus universal. O Deus dos cristãos se mostrava a todos os homens que quiseram segui-lo sem distinção de sua origem. Segundo o cristianismo, O Senhor queria um novo povo ao que qualquer homem de boa vontade podia pertencer e esse novo povo era a Igreja. Essa é a razão pela qual diferentes denominações cristãs nomeiam a si mesmas como o Novo Israel.
No princípio, os primeiros cristãos se consideravam parte do povo judeus, oravam nas sinagogas e respeitavam toda a Torá. No primeiro Concílio de Jerusalém, narrado no capítulo 15 do livro de Atos dos Apóstolos, se diz que os gentios que abraçavam a Cristo não estavam obrigados a cumprir a Torá dada ao povo de Israel. Por exemplo, os cristãos de origem gentílica não estavam obrigados a circuncidar-se (apenas a guardar certos mandamentos, como o Shabat) até que se o processo de conversão fosse finalizado e os mesmos passassem a ser parte integrante da comunidade de Israel. A partir deste momento, o cristianismo começou a separar-se gradualmente do judaísmo.
O pai-nosso foi fundamental neste ponto. Ao separar-se do judaísmo, o cristianismo teve que ir adquirindo uma identidade própria e a principal separação da espiritualidade judaica era a oração. O cristianismo teria que buscar sua própria oração, para não ser considerado uma seita do judaísmo. O pai-nosso passaria a ser a principal separação que diferenciaria o povo "novo" do "velho" neste ponto da história. A diferença não estava muito clara, entre os judeus e os primeiros seguidores do cristianismo.
Os primeiros cristãos tinham um grande respeito pela Oração dominical. A Oração dominical não se ensinava a qualquer um. Sua recitação constituía um privilégio que só se outorgava aos que já haviam recebido o batismo. Era a última coisa que se ensinava aos catecúmenos e só na véspera de seu batismo. Era a maior e mais apreciada jóia da fé.
Os antigos cristãos das Igrejas da África tomaram sua profissão de fé (quid credendum) desta oração. Uma profissão de fé é uma declaração de suas crenças, um exemplo disto é a oração do Credo, o símbolo niceno do catolicismo latino e oriental. Os que pretendiam obter o batismo deviam ter um profundo conhecimento da oração (quid orandum). Os catecúmenos deviam de seguir detalhadamente a explicação do credo e posteriormente deviam recitá-lo publicamente de memória. A transição entre estes passos era o pai-nosso. A profissão de fé no cristianismo é uma parte fundamental, pois mediante ela se declaram quais são suas crenças fundamentais e básicas. O fim que as igrejas primitivas da África tomaram como base para sua profissão de fé demostra que, desde o princípio do cristianismo, estas palavras de Jesus foram consideradas as mais santas palavras.
Na igreja primitiva, a oração do pai-nosso estava reservada para o momento mais alto da celebração que posteriormente o catolicismo chamaria missa. Haviam de preceder fórmulas que se assemelhavam seu respeito. Estas fórmulas têm sido herdadas por igrejas em suas liturgias atuais: na liturgia da igreja oriental, se diz como introdução: "Tu és digno, ó Senhor, concede-nos que alegremente e sem temor, nos atrevamos a te invocar, Deus celestial, como um Pai, e que digamos: Pai nosso...". Na primitiva liturgia romana o sacerdote precedia a oração com a frase: "nos atrevemos a dizer", reconhecendo a enorme audácia que há em repetir palavras consideradas tão santas pelo cristianismo.
Análise
Será usada a tradução da Bíblia de Jerusalém (BJ) (veja acima)
Instruções preliminares
Antes de propor os termos da oração, Jesus faz algumas orientações preliminares (Mateus 6:5–8).
A Edição Pastoral da Bíblia comenta essa passagem por meio de uma nota de rodapé relativa a Mateus 6:5–6,[10] que diz que:
“
Na oração, o homem se volta para Deus, reconhecendo-o como único absoluto, e reconhecendo a si mesmo como criatura, relativizando a auto-suficiência. Por isso, rezar para ser elogiado é colocar-se como centro, falsificando a oração.
A Bíblia do Peregrino[12] comenta essas instruções preliminares por meio de notas de rodapé que observam que:
não se referem à oração comunitária que é necessariamente pública e é respaldada por diversos salmos que se referem ao louvor a Deus perante a assembleia;
não se deve converter a oração em espetáculo, pois seria um contrassenso louvar a Deus para glória própria, que não estaria confinado no templo, mas presente em toda a parte, ainda que oculto (cf. Isaías 45:15);
se referem às preces que deveriam ser feitas em horas fixas, e nessas ocasiões os hipócritas procuravam se fazer notar;
traduz a primeira parte de Mateus 6:7 como "Quando orardes não multipliqueis as palavras", e diz que o verbo grego "battalogein" permite diversas interpretações, razões pelas alguns preferem traduzir como: "(não) dizer coisas vãs" ou "(não) dizer palavras sem sentido", outros dizem que Jesus se referia a suspiros mágicos que multiplicavam fórmulas abracadábricas para aplacar a divindade;
Junto as duas primeiras palavras—"Pai nosso"—são um título usado em outro lugar no Novo Testamento, bem como na literatura judaica. Refere-se a Deus Pai.
Isso também implica a proximidade entre a natureza pessoal da relação entre Deus Pai e essa oração, como um pai e uma criança, como ensinado por Jesus em cada um dos seus quatro evangelhos.
Não trinitários podem tomar essa linha referente ao posicionamento de Deus como pai de toda a humanidade, incluindo Jesus a quem é normalmente posicionado como o filho.
A Bíblia do Peregrino, que traduz essa frase como: "Pai nosso do céu!" observa[14] que:
na versão da oração apresentada no Evangelho segundo Lucas (cf. Lucas 11:2) a evocação é feita simplesmente ao "Pai", que talvez seja a fórmula original da oração;
Tendo iniciado, a oração começa da mesma maneira como o Kadish, santificando o nome de Deus, e seguindo expressa a vontade de que a vontade de Deus e o Reino aconteçam. No judaísmo o nome de Deus é de importância extrema, e honrar o nome é central à piedade. Os nomes não são vistos simplesmente como rótulos, mas como reflexões verdadeiras da natureza e identidade do qual eles se referem. Assim, a oração que santifica-se o nome de Deus era tida como equivalente a santificar o próprio Deus. "Santificado seja" está na voz passiva por isso não indica quem é que está santificando. Uma interpretação é que há uma chamada a todos os crentes para honrar o nome de Deus. Quem vir a oração primariamente como escatológica concebe a oração ser uma expressão de desejo pelo fim dos tempos, quando o nome de Deus, na visão destes relata a oração, será universalmente honrado.
a tradução literal seria: "que o teu nome seja santificado";
o "Nome" de Deus é um termo bíblico tradicional para designar respeitosamente o seu "ser", principalmente nos textos cultuais, portanto, "Santificar" a Deus ou o seu "Nome" é uma expressão bastante empregada na Bíblia e no judaísmo;
como Deus é "Santo" por excelência, a expressão reconhece e proclama tal fato e presta glória a Deus (cf. João 12:28);
a Bíblia e o judaísmo conhecem dois modos de santificar a Deus ou o seu nome:
O pedido para que o Reino de Deus venha é geralmente interpretado como uma referência à crença, comum na época, que a figura do Messias traria o Reino de Deus. Tradicionalmente, a vinda do Reino de Deus é visto como um dom divino recebido na oração, e não uma conquista humana. Esta ideia é muitas vezes contestada por grupos que acreditam que o Reino virá pelas mãos dos fiéis que trabalharam por um mundo melhor. Acredita-se por estes indivíduos que a ordem de Jesus para alimentar o faminto e vestir os necessitados é o Reino referido por Ele.[15]
A Bíblia do Peregrino, que traduz essa frase como: "venha o teu reinado", observa[16] que:
tal pedido da vinda é o pedido de sua realização histórica final, descrita em: Salmos 98:8–9 e corresponde ao anúncio primordial da boa nova, por obra de João Batista e de Jesus, um período no qual Deus regerá a história dos homens (cf. Salmos 82:8 e Salmos 98:);
a tradução literal seria: "que o teu Reinado venha";
pede-se que o Reinado inaugurado por Jesus se manifeste e seja definitivamente reconhecido por toda a terra;
em Mateus 3:2, João Batista havia se referido a esse Reinado como "Reinado dos Céus", em conformidade com uma tradição judaica que evitava pronunciar o Nome de Deus;
a expressão "Reinado dos Céus" não designa um "reino celeste", mas o Reino Daquele que está nos céus (cf. Mateus 5:48, Mateus 6:9 e Mateus 7:21) sobre o mundo;
alguns manuscritos apresentam essa frase em Lucas 11:2 como "Faze vir sobre nós o teu Reinado", outros substituem esse pedido (ou o anterior) por "Faze vir o Teu Espírito Santo sobre nós, e que ele nos purifique", tal opção pode decorrer de influência da liturgia do batismo.
"seja feita a Vossa vontade assim na terra como no céu."
A oração seguinte, com uma expressão de esperança que seja feita a vontade de Deus. Alguns vêem a expressão da esperança como um anexo, declarando um pedido para que a terra esteja sob comando divino diretamente e manifestadamente. Outros veem isso como um convite às pessoas para se submeter a Deus e a seus ensinamentos. Nos Evangelhos, estes pedidos têm o esclarecimento acrescentado na terra, como no céu, uma frase ambígua em grego que pode ser uma símile (i.e fazer a terra parecida com o céu) , ou um paralelismo (i.e tanto no céu quanto na terra), contudo a símile seja uma significativa interpretação mais comum.
A Bíblia do Peregrino, que traduz essa frase como: "cumpra-se o teu designo na terra como no céu", observa que cumprir o desígnio equivale a exercer o reinado.
esse pedido não é uma prece de resignação, mas um apelo à Deus para que faça com que sua vontade se cumpra, trata-se de um pedido estreitamente ligado com os dois anteriores (cf. Isaías 44:28, Isaías 46:10–11, Isaías 48:14, Efésios 1:5 e Efésios 1:9);
a tradução mais como para a segunda parte da petição: "assim na terra como no céu" é inadequada, pois insinua que se trata de uma adição (na terra e também no céu), quando o verdadeiro sentido é pedir que se realize na terra uma situação que já existe no céus (cf. Daniel 4:33 e I Macabeus 3:60);
o Céu é concebido como o Reino de Deus totalmente realizado, portanto, a terra deve converte-se em imagem do Céu.
"O pão nosso de cada dia nos dai hoje"
Os versos seguintes são pedidos mais pessoais, diferentes do Kadish. O primeiro está relacionado ao pão "diário". Normalmente o significado da palavra traduzida como diário, (gr: ἐπιούσιος/trans:epiousios), é obscuro. A palavra é um hápax, ocorrendo somente nas versões de Lucas e Mateus do pai-nosso. (Uma vez pensou-se equivocadamente ter encontrado a palavra em um livro de contabilidade do Egito.).[19]Pão diário parece ser uma referência à passagem na qual Deus provia maná aos israelitas a cada dia enquanto eles estavam no deserto (Êxodo 16:15–21). Já que eles não podiam manter qualquer maná durante a noite, tiveram que depender de Deus para fornecer um novo a cada manhã. Etimologicamente epiousios parece estar relacionado com as palavras gregas "epi" (sobre, acima, em, contra) e "ousia" (substância). Os primeiros escritores cristãos ligaram o conceito à transubstanciaçãoeucarística, o que alguns estudiosos protestantes modernos tendem a rejeitar, argumentando que a prática da Eucaristia e da doutrina da transubstanciação foram ambas desenvolvidas depois que Mateus foi escrito. Epiousios também pode ser entendida como a existência, ou seja, o pão que foi fundamental para a sobrevivência (como na Peshitta siríaca onde a linha é traduzida por "dar-nos o pão da que temos necessidade hoje."). Na época, pão era o alimento mais importante para a sobrevivência. No entanto, os estudiosos da linguística consideram essa versão improvável, uma vez que violaria as regras padrão de formação de palavras. O grego koiné tinha vários termos mais comuns para a mesma ideia. Alguns interpretam epiousios no sentido de amanhã, como na redacção dada pelo Evangelho dos Nazarenos para a oração.[20] A tradução tradicional, "diário", está convenientemente próxima do significado desejado pelas duas outras possibilidades. Os cristãos que leem a Oração do Senhor sob um prisma escatológico, entendem epiousios como referindo-se à Segunda Vinda - a leitura para amanhã (e pão) num sentido metafórico. A maioria dos estudiosos discorda, sobretudo porque Jesus é retratado em Lucas e Mateus como cuidador de necessidades diárias de seus seguidores, especialmente nos milagres relacionados ao pão.[21][22]
outras traduções possíveis seriam: "pão necessário à subsistência" ou "pão de amanhã", ou seja, deve-se pedir à Deus nada mais do que o sustento indispensável à vida material;
A Bíblia do Peregrino, que traduz essa frase como: "dá-nos hoje o pão de amanhã", observa que:
existem dúvidas sobre o significado do termo: "epiousion", encontrado nos manuscritos mais antigos, e nesse contexto a Vulgata traduziu o termo, no Evangelho segundo Mateus como "supersubstantialem" e no Evangelho segundo Lucas como "quotidianum", e, nesse contexto surgem duas interpretações: o pão empírico cotidiano dado a todo vivente (cf. Salmos 136:25); e o pão do amanhã escatológico (cf. João 6:);
a segunda interpretação seria mais provável (cf. Êxodo 19:25), a não ser que prevaleça o duplo sentido, e no sustento diário da vida se vislumbre a vida eterna.
diante da dificuldade para traduzir o adjetivo em grego que qualifica o pão solicitado, pois trata-se de palavra que não é empregada em nenhum outro lugar do Novo Testamento, preferiu-se traduzi-lo como: "(pão) de que precisamos";
não foram adotadas as expressões: "pão de amanhã" ou "pão do dia que vem", apesar do fato de que o adjetivo em grego habitualmente se referia ao "dia que começa", pois pedir hoje o "pão de amanhã" estaria em desconformidade com Mateus 6:34 e Provérbios 27:1, ainda que se considere que esse "pão de amanhã" poderia ter caráter escatológico, e, portanto se referir ao pão do banquete do mundo vindouro;
também não foram adotadas as expressões: "pão de hoje" ou "pão nosso até amanhã", apesar do fato de que o adjetivo em grego também poder ser empregado para se referir o dia presente ou a tarde do dia que começa, ou seja, como oposto do "dia seguinte"), ainda que se considere que esse que tal opção identificaria o pão pedido com o maná, que tinha que ser consumido no dia em que caia ou apodreceria;
a opção por traduzir como "pão necessário à subsistência" foi descartada, pois se entendeu que era pouco provável que Jesus tenha utilizado a frase com esse sentido;
é comum se ver nesse pedido uma referência à Eucaristia ou à "Palavra de Deus";
esse pedido não exige uma segurança para o futuro, Jesus estimula seus discípulos a pedirem "dia após dia" o alimento de que precisam, na certeza de que Deus proverá cada dia, assim como alimentou o povo no deserto com o maná (cf. Êxodo 16:4–5);
enquanto a versão dessa frase apresentada no Evangelho segundo Mateus somente pode ser traduzida como um pedido do "pão de hoje", na versão apresentada no Evangelho segundo Lucas, pede-se o "o pão que nos é necessário para cada dia", pois naquele Evangelho encara-se a vida cristã como um esforço diário (cf. Lucas 9:23), enquanto que o Evangelho segundo Mateus tem uma perspectiva diferente (cf. Mateus 6:34).
"E perdoa-nos as nossas dívidas como também nós perdoamos aos nossos devedores."
A Tradução Ecumênica da Bíblia, que traduziu essa petição como: "perdoa-nos as nossas faltas contra ti, como nós mesmos temos perdoado aos que tinham faltas contra nós", observa que:
a tradução literal seria: "perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado àqueles que nos deviam";
a dívida é uma obrigação especialmente grave no mundo antigo, tanto que podia dar causa a perda da liberdade (cf. Mateus 18:23–35);
esse termo é empregado no judaísmo para designar a situação do homem diante de Deus, de quem é devedor insolvente (estado de pecador, cf. Lucas 13:2–4);
quando se considera que no mundo moderno é comum a tomada de empréstimos, entendeu-se que o termo "dívida" não revelaria a gravidade da situação, e, portanto, empregou-se o termo "faltas" que representa melhor a ofensa feita pessoalmente a Deus e a situação miserável do pecar;
o perdão dos pecados é a graça por excelência, pois somos incapazes de reparar nossos pecado;
Jesus procura relacionar fortemente nossas obrigações perante Deus com as nossas obrigações perante nossos irmãos;
A Bíblia do Peregrino, que traduz essa frase como: "não nos deixe sucumbir à prova", observa[26] que a provação é condição de todo homem, inclusive do religioso (cf. Eclesiástico 2:1–5, Eclesiástico 2:1–5 e Sabedoria 3:5), portanto, não cabe pedir para não estar sujeitos às provas, mas de ter força para superá-las (cf. Mateus 26:41).
por outro lado, entende-se que nada escapa à soberania de Deus, nem sequer o próprio Satanás, portanto trata-se de um pedido por uma intervenção ativa de Deus;
também seria possível traduzir como: "faze que não entremos na tentação", ou seja seria um pedido para nos preservar de cair nas intenções do tentador (cf. I Timóteo 6:9).
essa frase pode ser um acréscimo proposto por Mateus, pois não consta na versão da oração apresentada em Lucas 11:2–4;[18]
algumas versões da oração acrescentam: "Porque a ti pertencem o Reino o Poder e a Glória pelos séculos. Amém".[27]
A Bíblia do Peregrino, que traduz essa frase como: "livra-nos do maligno", observa que o maligno é o tentador, que na provação tenta provocar a queda, é o Satã, a serpente que tentou Eva.
A Tradução Ecumênica da Bíblia, observa que alguns manuscritos, acrescentam o seguinte epílogo: "pois teus são o reino, o poder e a glória para sempre", que provém da liturgia e que é empregada em uma versão ecumênica da oração.
Explicações posteriores
Os versículos seguintes (14 e 15) dedicam-se à importância do dever de perdoar os irmãos.
A versão latina da oração tem importância cultural e histórica no Ocidente e principalmente na Igreja Católica. O texto usado na liturgia (Missa, Liturgia das Horas, etc.) diverge levemente do que foi usado na Vulgata e provavelmente é anterior a ela.
A doxologia associada a Oração do Senhor é encontrada em quatro manuscritos da Vetus Latina, apenas duas dão em sua integridade o texto. Outros manuscritos sobreviventes da Vetus Latina não tem a doxologia. A tradução da Vulgata também não a inclui, concordando assim com as edições críticas do texto grego.
Nas liturgias do rito latino, a doxologia nunca está ligada a Oração do Senhor. Usa-se na Missa do Vaticano II (revisada após o Concílio do Vaticano II), localizada não imediatamente após a Oração do Senhor, mas sim após a oração sacerdotal, Libera nos, quaesumus..., que elabora a petição final, Libera nos a malo (Livra-nos do mal).
Pai-Nosso na Igreja Católica
Segundo a doutrina católica, Jesus ensinou o pai-nosso[28] aos seus discípulos, que estavam ansiosos em saber como rezar bem, no famoso Sermão da Montanha. O Pai-Nosso ou Padre-Nosso é uma "oração cristã insubstituível", "a síntese de todo o Evangelho (Tertuliano) e a oração perfeitíssima (São Tomás de Aquino)". "A tradição litúrgica da Igreja usou sempre o texto de Mateus 6, 9-13.[29]
3. Fiat voluntas tua, sicut in caelo, et in terra.
4. Panem nostrum quotidiánum da nobis hódie.
5. Et dimítte nobis débita nostra, sicut et nos dimíttimus debitóribus nostris.
6. Et ne nos indúcas in tentatiónem;
7. Sed líbera nos a malo. Amen
Para a Igreja Católica, o pai-nosso é também "a oração da Igreja por excelência [...] visto que as suas sete petições, fundadas no mistério da salvação já realizada, [...] serão plenamente atendidas na vinda do Senhor. O pai-nosso é também parte integrante da Liturgia das Horas".[32] Estas "sete petições a Deus Pai" são divididas em duas partes:[33]
"as primeiras três, mais teologais, aproximam-nos d’Ele, para a sua glória: pois é próprio do amor pensar antes de mais n’Aquele que amamos. Elas sugerem o que em especial devemos pedir-Lhe: a santificação do seu Nome, a vinda do seu Reino, a realização da sua Vontade".[33]
"as últimas quatro apresentam ao Pai de misericórdia as nossas misérias e as nossas expectativas. Pedimos que nos alimente, nos perdoe, nos defenda nas tentações e nos livre do Maligno".[33]
Para além destas petições, o pai-nosso também revela à humanidade a sua relação especial e filial com Deus Pai. A partir de então, "podemos invocar a Deus como Pai [...] porque Ele nos foi revelado por seu Filho feito homem e porque o seu Espírito no-Lo faz conhecer. [...] Ao rezar a oração do Senhor estamos conscientes" e absolutamente confiantes de sermos filhos de Deus[34] e de sermos "amados e atendidos" por Deus Pai.[35] "Sempre que rezamos ao Pai, adoramo-Lo e glorificamo-Lo com o Filho e o Espírito", porque estas três Pessoas divinas formam a Santíssima Trindade.[36]
Nesta oração considerada pelos católicos como única e profunda em significado, os fiéis invocam também Deus como "Pai Nosso [...] porque a Igreja de Cristo é a comunhão duma multidão de irmãos que têm um só coração, uma só alma (At 4,32)" e um só Deus.[36] Jesus, nesta oração, afirma que Deus está nos céus porque Ele, o infinitamente santo, não está apenas num lugar físico próprio, mas sim "no coração dos justos", daqueles que fazem a Sua vontade. Esta afirmação também faz lembrar aos crentes que "o céu, ou a Casa do Pai, constitui a verdadeira pátria para a qual tendemos na esperança, enquanto estamos ainda na terra. Nós vivemos já nela 'escondidos com Cristo em Deus' (Cl 3,3)".[37]
Pai-nosso no protestantismo
Nas igrejas protestantes o pai-nosso é visto como um modelo de oração, e não uma reza, baseado em uma interpretação da fala de Jesus em Mateus:6:7
E quando orarem, não fiquem sempre repetindo a mesma coisa, como fazem os pagãos. Eles pensam que por muito falarem serão ouvidos.
Mateus 6:7
Nem todas as igrejas tem esse mesmo posicionamento como as igrejas Anglicanas e Luteranas que recitam nos cultos essa oração, a versão mais comum do pai-nosso é a de João Ferreira de Almeida que Diz:
Portanto, vós orareis assim: Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o Teu nome;
venha a nós o Teu reino; Seja feita a Tua vontade, assim na terra como no céu;
O pão nosso de cada dia nos dai hoje;
E perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores;
E não nos deixes cair em tentação; mas livra-nos do mal. Pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém!
Mateus 6:9-13
Uma das diferenças entre a versão protestante e a católica é o acréscimo da última parte constante em Mateus 6:13 [pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre.] na versão protestante. Isso se deu por ordem do rei Enrique VIII da Inglaterra.
Tal circunstância sugere que Mateus talvez tenha feito acréscimos à versão básica da oração, apresentada em Lucas 11:2–4.
A Bíblia do Peregrino, por meio de Nota de Rodapé à Lucas 11:2–4, também sustenta que a versão apresentada no Evangelho segundo Lucas, que é mais breve, pois contém cinco petições em vez de sete, talvez seja mais próxima da oração realmente proposta por Jesus.
↑A Bíblia do Peregrino, além de comentar as instruções preliminares, observa, por meio de Nota de Rodapé à Mateus 6:9–13, que:
os católicos costumam se referir a essa oração como "oração dominical" pois foi ensinada pelo próprio Senhor (Dominus), e por isso tem lugar privilegiado na liturgia católica;
é uma oração que contém uma invocação e sete pedidos, três em honra a Deus e quatro a favor do homem, que sintetizam a dimensão empírica com a transcendente (Pai/céu, reino/venha, terra/céu, perdoamos/perdoa).
↑Além disso a Tradução Ecumênica da Bíblia destaca a correlação/paralelismo entre:
↑"Assim como o nome de Deus é santo em si mesmo e ainda oramos para que Ele possa ser santo entre nós, então também o seu reino vem de si mesmo sem a nossa oração, nós ainda oramos e que Ele venha para nós, isto é, que possa existir entre nós e conosco, de modo que pode ser uma parte daqueles entre os quais seu nome é santificado e seu reino floresça" (Martinho Lutero, Catecismo Maior, Livro de Concórdia, p.446, Kolb/Wengert).
↑In his Commentary on Matthew, Jerome, citing the Gospel of the Hebrews, but referring in fact to the similar Gospel of the Nazoraeans, writes that "in the so-called Gospel of the Hebrews for supersubstantial bread one finds MAHAR, which translates as of tomorrow. Therefore the meaning would be give us today our bread of tomorrow, i.e. our future bread". In the original Latin, "In Evangelio quod appellatur secundum Hebraeos, pro supersubstantiali pane, reperi MAHAR (מחר), quod dicitur crastinum; ut sit sensus: Panem nostrum crastinum, id est, futurum da nobis hodie."
↑In A Rabbinic Commentary on the New Testament (1987), pp.119-121, ISBN 978-0-88125-089-3, Samuel Tobias Lachs points out that bread "sufficient for our tomorrow" (de maherenu) in Hebrew letters differs by only one letter from bread "sufficient for our needs" (de mahserenu) and is probably a transcription error caused by the loss of the single letter (sameq).
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