Em estados fronteiriços como Táchira e Zulia[3] o problema é agravado por conta da facilidade de transporte de mercadorias contrabandeadas da Venezuela para a Colômbia, fato que vem ocorrendo desde o início de 2013 e que perdura até hoje.[4]
Antecedentes
Antes da presidência de Nicolás Maduro, a Venezuela enfrentou insuficiências ocasionais, principalmente devido à alta inflação e ineficiência do governo durante a Revolução Bolivariana.[8] A escassez desenfreada começou em de 2005, quando 5% dos produtos básicos ficaram indisponíveis de acordo com o Banco Central da Venezuela.[9] Apenas três anos depois, foi relatada uma carência de 24,7% dos produtos básicos, mostrando uma tendência crescente que durou até maio de 2008, quando a ausência de produtos caiu para 16,3%.[10] Todavia, a escassez voltou a se expandir em Janeiro de 2012 até atingir seu o recorde de 28% em fevereiro 2014.[10][11] O governo da Venezuela parou de relatar a falta de produtos quando a taxa ultrapassou os 28%.[12] Em janeiro de 2015, a hashtag#AnaquelesVaciosEnVenezuela e #EmptyShelvesInVenezuela (prateleiras vazias na Venezuela, em português) foram os assuntos mais discutidos na rede social Twitter, com os venezuelanos postando fotos de prateleiras de supermercado vazias por todo o país.[13]
Em agosto de 2015, a agência estadunidense de inteligência privada Stratfor divulgou duas imagens fotografadas por satélite de Puerto Cabello - o principal porto de mercadorias importadas de Venezuela - a fim de mostrar o grave problema da escassez. Foi mostrada uma imagem de fevereiro de 2012, a qual exibia os portos cheios de contêineres, quando os gastos do governo venezuelano estavam perto do recorde para as eleições presidenciais de 2012. A segunda imagem, de junho 2015, mostra o porto com muito menos contêineres, pois o governo da Venezuela já não podia se dar ao luxo de importar mercadorias por conta da desvalorização do petróleo.[14]
Dependência do petróleo
Devido às grandes reservas de petróleo[15] e à austeridade contra a propriedade privada[16], a maior fonte de dólares do país é o petróleo. Em 2012, para cada 100 dólares investidos no país, mais 90 vieram do óleo e seus derivados.[17] Com a queda de preços da substância em 2015[18], o país enfrenta uma queda acentuada de receita estrangeira.[19]
Controle do câmbio
Desde fevereiro de 2003, a Revolução Bolivariana tem implementado diferentes sistemas de controle de câmbio com o objetivo de regular o que o governo chamou de "fuga de capitais".[20][21] Órgãos governamentais são responsáveis pela fixação de taxas de câmbio diferentes em relação ao dólar, limitando a quantidade de moeda que cada cidadão venezuelano pode obter. Durante todo o governo de Hugo Chávez, medidas agrícolas causaram um aumento das importações de alimentos. Em razão dessas políticas, a produção doméstica de carne bovina, arroz e leite diminuíram.[22][23]
Por outro lado, o controle de câmbio implicou no surgimento de uma moeda paralela no mercado negro, devido à saturação do mercado oficial pela elevada dependência das importações.[24] Enfraquecido pelos elevados níveis de liquidez monetária, o bolívar venezuelano continuou a se desvalorizar[24] o que, somado à redução de produção de bens nacionais, aos obstáculos nas importações e à burocracia elevada, provocou um aumento considerável nos preços dos produtos.[25]
O governo federal tem tomado uma série de medidas econômicas, incluindo o controle de preços, que em vez de resolver a situação, segundo economistas, contribui para o aumento do mercado negro.[26]
Expropriações
Segundo o economista Anjo Alayón, "o governo da Venezuela detém o controle direto sobre a distribuição de alimentos no país". A distribuição de todos os alimentos, mesmo entre empresas privadas, é controlada pelo governo.[27] No entanto, Alayon afirma que o problema não é de distribuição e sim de produção, pois "ninguém pode distribuir o que não ocorre."[27] Desapropriações feitas pelo governo levaram a uma forte queda de produção na Venezuela.[27][28][29]
De acordo com Miguel Angel Santos, pesquisador da Universidade de Harvard, como resultado das expropriações dos meios privados de produção que ocorre desde 2004, "a produção foi destruída (...) quando a Venezuela tinha o dinheiro das importações abundantes de petróleo”.[30]
Contrabando
Em uma entrevista feita pelo The Guardian, o presidente Nicolás Maduro admitiu que uma “proporção significativa” de produtos subsidiados estavam sendo contrabandeados para a Colômbia e vendidos por preços muito mais elevados.[31] O governo venezuelano afirma que cerca de 40% das mercadorias que subsidia são contrabandeadas para países vizinhos. No entanto, diversos economistas discordam da afirmação de maduro, e apontam que o número real de produtos contrabandeados gira em torno de 10%.[32] Consonante com os economistas, a Reuters também identificou o controle cambial como o principal fator para o contrabando.[33]
Consumo de alimentos
Elías Eljuri, presidente do Instituto Nacional de Estatísticas, foi a público em 2013, numa entrevista concedida à Televen (uma das TVs estatais do país), para mostrar que uma das causas da escassez é a de que o povo está comendo muito mais.[34][35][36] Entretanto, dados proporcionados pela oficina de estatísticas do governo venezuelano mostrou que, na realidade, o consumo de alimentos diminuiu.[37]
Respostas oficiais e medidas do Governo
Durante os governos de Hugo Chávez e de Nicolás Maduro, houve um aumento de consumo devido ao crescente poder de compra dos venezuelanos, que não pode ser facilmente satisfeita por subsídios. O governo também responsabiliza o contrabando como um dos motivos da crise. Alexander Fleming, ex-ministro do comércio entre 2013-2014, atribui a raiz do problema aos "improdutivos parasitas", ou seja, empresas, que utilizam a moeda do Estado para levantar capital em vez de se dedicar à fornecer alimentos à população.[38]
Como já dito anteriormente, uma das respostas oficiais do governo foi emitida pelo Presidente do INE, Elias Eljuri, que aponta o “excesso de apetite” como uma das causas.[34][35][36]
De acordo com dados do Banco Central da Venezuela (BCV), os preços dos alimentos aumentaram 76,2% entre maio de 2013 e maio de 2014, e de acordo Solomon Centeno, economista e professor universitário, estima-se baseado em estatísticas que a inflação dos alimentos chegou a 100%.[39] O BCV também registrou um déficit de bens de 26,9% em março de 2014.[40]
Outros economistas estatais indicam que o governo venezuelano começou o racionamento em razão de vários problemas, incluindo uma improdutiva indústria nacional, que foi afetada negativamente por estatizações e intervenção governamental.[41]
Em fevereiro de 2014, o governo alegou ter apreendido mais de 3.500 toneladas de produtos, incluindo alimentos e combustíveis contrabandeados na fronteira com a Colômbia. O presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, disse que a comida confiscada deve ser oferecida para os venezuelanos, e não para “bandidos”.[42]
Em março de 2014, o presidente Maduro introduziu o "cartão seguro" usado para compras em supermercados do estado, com a finalidade de combater o contrabando e o mercado negro.[43] Meses após a introdução do cartão, que foi relatado que 503.000 venezuelanos se inscreveram neste programa.[44]
Pouco depois, em agosto de 2014, o presidente anunciou a criação de um novo sistema de digitalização de impressões digitais, cuja adesão é voluntária, também a fim de combater a escassez de alimentos.[45][46] O governo venezuelano anunciou que 17.000 soldados seriam movidos na fronteira com a Colômbia, com o propósito de combater o contrabando.[47][48] Consumidores venezuelanos expressaram posições adversas em relação a essas políticas, alegando que o sistema não faz nada para aliviar a escassez e de não estimular diretamente o aumento da produção.[41]
Devido à escassez de bens, diversos ataques têm sido reportados no momento em que os cidadãos estão comprando seus produtos. Os motociclistas são especialmente atingidos, já que não há peças de reposição nem motocicletas à venda. Policiais também são especialmente atacados, normalmente em tentativas de levar suas armas.[52]
Em julho de 2015, a BBC noticiou que, devivo à escassez de bens comuns de primeira necessidade, virou comum a divulgação nas redes sociais de venezuelanos saqueando caminhões e supermercados.[53]
Crise hospitalar
A crise hospitalar começou a aparecer no início de 2013[54] com a falta de medicamentos. A expectativa de vida diminuiu e pacientes que sofrem de doenças como câncer, asma, epilepsia, diabetes, parkinson e Alzheimer tiveram que recorrer a outras instituições ou percorrer grandes rotas entre os estados para encontrar medicamentos. Além desses medicamentos, é registrada a falta de anti-inflamatórios, anestesia e antialérgicos. Há ainda a carência de instrumentos cirúrgicos como bisturis, seringas, agulhas hipodérmicas, hidrogel e cateteres.[55] O custo exorbitante de novos equipamentos exige a manutenção forçada de aparelhos antigos, além da limpeza constante, o que é dificultado pela falta de detergentes comuns e de detergentes enzimáticos, propiciando infecções hospitalares, principalmente por causa das epidemias atuais que afligem o país; como o Chicungunha e a dengue.[56]
A falta de detergentes para limpeza de tubos endotraqueais causou a infecção de vários recém-nascidos, além de complicações na gravidez.[55]
Estima-se que pelo menos quinze crianças morrem todos os dias em unidades de terapia intensiva na Venezuela, principalmente como casos decorrentes de infecções. A falta de sedativos durante a intubação gera ansiedade no paciente, causando espasmos, desconforto e a necessidade de remover o tubo; o que força a contenção física do paciente por meio de cintos e cordas para imobilizá-lo e evitar remoção do tubo.[55] Pela superlotação dos hospitais bem como pela falta de macas, internações são feitas nos corredores ou no chão.[56] Em setembro de 2016, imagens de bebês recém-nascidos colocados em caixa de papelão circularam as redes sociais. As imagens foram publicadas por Manuel Ferreira, diretor de Direitos Humanos da coalização opositora.[57]
Artigos que foram reportados como escassos
Até novembro de 2015, diversos produtos dos mais diversos setores desapareceram ou ficaram raros no mercado.[58][59]