Sarbaro
Sarbaro, Xarbaraz ou Xarvaraz foi xá (rei dos reis ou imperador) do Império Sassânida de 27 de abril a 9 de junho de 630. Usurpou o trono de Artaxer III e foi morto por nobres iranianos após quarenta dias. Antes da usurpação, era um aspabedes (general) sob Cosroes II (r. 590–628). Além disso, é conhecido por seu importante papel durante a guerra bizantino-sassânida de 602-628, e os eventos que se seguiram depois. NomeXarbaraz é na verdade um título, que significa literalmente "o Javali do império", atestando sua destreza no comando militar e sua personalidade guerreira, já que o javali era o animal associado ao zoroastrista izade Varã, o epítome da vitória. Shahrwarāz (pálavi inscricional: 𐭱𐭲𐭫𐭥𐭫𐭠𐭰 štlwlʾc[1]) é uma palavra persa média, com šahr significando "país" e warāz significando "javali". Esta palavra é traduzida como Xarbaraz (em persa: شهربراز; romaniz.: Šahrbarāz) em persa novo e como Sarbaro (em grego: Σάρβαρος; em latim: Sarbarus), Salbaras (Σαλβάρας) e Sarbarazas (Σαρβαραζας) nas fontes bizantinas, Sar Varaz (Սահր Վարազ) em Moisés de Dascurã e Sebeos.[2] Ferdusi usou no Xanamé a forma abreviada Gurāz (گراز, literalmente "javali"), que vem do persa médio warāz.[3] De acordo com Tabari, seu nome verdadeiro era Farrucã (em árabe: فرخان; romaniz.: Farrukhān). Foi corrompido como Coreã (Խորեամ) em fontes armênias[4] e Faraim (em árabe: فرایین; romaniz.: Farāyīn) no Xanamé de Ferdusi. O mesmo autor dividiu a personagem de Sarbaro em dois: Faraim, que era o usurpador, e Xarã-Guraz, que apoiou a rebelião de Barã Chobim.[3] As fontes ainda usam o título de Rasmiozã (em grego: Ρασμιόζαν (Teófanes) e em armênio: Ռազմյոզան (Moisés de Dascurã)), que foi ainda registrado com Rusmíazas (em grego: Ρουσμίαζας), Rumiazã (Crônica de 1224), Erasmã (Sebeos), Rumizã (Bar Hebreu),[4] Erasmiozã, Rasmaiuzã, Romezã, Rumbuzã e Rasmiosdã.[5] VidaPrimeiros anosSarbaro pertencia à Casa de Mirranes,[6] um dos sete clãs partas; era filho de um certo Artaxer. Durante a vida posterior de Sarbaro, se juntou ao exército sassânida, onde ascendeu a altos cargos, e foi nomeado aspabedes de Ninruz. Era casado com a irmã do xainxá Cosroes II, Mirranes, com quem teve um menino chamado Sapor-i Sarbaro.[7] Sarbaro ainda teve outro filho chamado Nicetas, cuja mãe é desconhecida.[8] Guerra com o Império BizantinoVer artigo principal: Guerra bizantino-sassânida de 602–628
Sarbaro é mencionado pela primeira vez quando Cosroes II iniciou a última e mais devastadora das guerras bizantino-sassânidas, que durou 26 anos. O xá, junto com Sarbaro e seus outros melhores generais, conquistou Dara e Edessa em 604, e no norte, os bizantinos foram levados de volta à antiga fronteira pré-591 antes de Cosroes II lhes dar a maior parte da Armênia sassânida, partes da Mesopotâmia e metade ocidental do Reino da Ibéria. Depois de reconquistar o território perdido, Cosroes retirou-se do campo de batalha e entregou as operações militares aos seus melhores generais. Sarbaro foi um deles. Em 610, Heráclio, um armênio[9] de provável descendência arsácida,[10] revoltou-se contra o imperador Focas e o matou, coroando-se imperador do Império Bizantino.[11] Depois de ascender, preparou um grande contra-ataque contra os sassânidas fora de Antioquia em 613, mas foi derrotado decisivamente por Sarbaro, que infligiu pesadas perdas ao exército bizantino e depois capturou a cidade, dando aos sassânidas acesso naval ao mar Mediterrâneo.[12][13] Após a derrota bizantina fora de Antioquia, Heráclio e seu irmão Teodoro, junto com o general Nicetas, combinaram seus exércitos na Síria, mas foram derrotados por Sarbaro e suas forças que cercaram Damasco e a capturaram junto com um grande número de tropas bizantinas como prisioneiros.[14] Além disso, Sarbaro também derrotou um exército bizantino perto de [[Daraa (cidade)|Adriate, que é mencionado no Alcorão.[15] Um dos eventos mais importantes de sua carreira foi quando liderou o exército sassânida em direção à Palestina e, após um cerco sangrento, capturou Jerusalém, cidade sagrada para os cristãos. Depois de sua conquista de Jerusalém, a Santa Cruz foi levada em triunfo. Em 618, Sarbaro foi ordenado por Cosroes II a invadir o Egito, e em 619, Alexandria, a capital do Egito bizantino, estava nas mãos dos sassânidas.[16][17] Após a queda de Alexandria, Sarbaro e suas forças estenderam o domínio sassânida ao sul ao longo do Nilo.[18] Em 621, a província estava seguramente nas mãos dos sassânidas, e um certo Saralaneozã foi nomeado seu governador.[19] Em 622, Heráclio contra-atacou o Império Sassânida na Anatólia. Sarbaro foi enviado para lá para lidar com ele, mas acabou sendo derrotado.[20] Após a vitória de Heráclio, marchou à Albânia e passou o inverno lá.[21] Sarbaro, junto com Saíno e Sarablangas foram posteriormente enviados pelas ordens de Cosroes II para prender as forças de Heráclio.[22] Saíno conseguiu derrotar o exército bizantino. Devido ao ciúme entre os comandantes sassânidas, Sarbaro apressou-se com seu exército para participar da glória da vitória. Heráclio os encontrou em Tigranacerta e derrotou as forças de Sarablangas e Saíno um após a outra. Após esta vitória, Heráclio atravessou o Araxes e acampou nas planícies do outro lado. Saíno, com os restos dos exércitos dele e de Sarablangas, juntou-se a Sarbaro na perseguição de Heráclio, mas os pântanos os atrasaram.[23] Em Aliovita, Sarbaro dividiu suas forças, enviando cerca de seis mil soldados para emboscar Heráclio enquanto o restante das tropas permaneceu em Aliovita. Heráclio lançou um ataque noturno surpresa ao acampamento principal sassânida em fevereiro de 625, destruindo-o. Sarbaro escapou por pouco, nu e sozinho, tendo perdido seu harém, bagagem e homens.[24] Heráclio passou o resto do inverno ao norte do lago Vã. Em 625, suas forças tentaram empurrar de volta para o Eufrates. Em apenas sete dias, contornou o monte Ararate e as 200 milhas ao longo do rio Arsânias para capturar Amida e Martirópolis, fortalezas importantes no alto Tigre.[25] Heráclio então seguiu em direção ao Eufrates, perseguido por Sarbaro. Segundo fontes árabes, foi detido no rio Satidama ou Batman Su e derrotado; fontes bizantinas, entretanto, não mencionam este incidente.[26] Outra escaramuça menor entre Heráclio e Sarbaro ocorreu no rio Saro perto de Adana.[27] Sarbaro estacionou suas forças do outro lado do rio dos bizantinos.[28] Uma ponte atravessava o rio, e os bizantinos atacaram imediatamente. Sarbaro fingiu recuar para levar os bizantinos a uma emboscada, e a vanguarda do exército de Heráclio foi destruída em poucos minutos. Os sassânidas, no entanto, não cobriram a ponte, e Heráclio avançou com a retaguarda, sem medo das flechas que os sassânidas dispararam, virando a maré da batalha contra os sassânidas. Sarbaro expressou sua admiração por Heráclio a um grego renegado: "Veja seu imperador! Não teme essas flechas e lanças mais do que uma bigorna!"[29] A Batalha do Saro foi uma retirada bem-sucedida aos bizantinos que os panegiristas magnificaram.[27] No rescaldo da batalha, o exército bizantino passou o inverno em Trebizonda.[29] Cerco de ConstantinoplaSarbaro, junto com um exército menor, mais tarde conseguiu passar pelos flancos de Heráclio e se aproximou de Calcedônia, a base sassânida do outro lado do Bósforo de Constantinopla. Cosroes II coordenou com o grão-cã dos ávaros para lançar um ataque coordenado a Constantinopla tanto do lado europeu quanto do asiático.[25] O exército de Sarbaro estacionou-se em Calcedônia, enquanto os ávaros se posicionaram no lado europeu de Constantinopla e destruíram o Aqueduto de Valente.[30] Por causa do controle da marinha bizantina do estreito de Bósforo, no entanto, os sassânidas não podiam enviar tropas para o lado europeu para ajudar seu aliado.[31][32] Isso reduziu a eficácia do cerco, porque os sassânidas eram especialistas em guerra de cerco.[33] Além disso, os sassânidas e os ávaros tiveram dificuldades de comunicação através do Bósforo protegido - embora, sem dúvida, houvesse alguma comunicação entre as duas forças.[25][32][34] Em 7 de agosto, uma frota de jangadas sassânidas transportando tropas pelo Bósforo foi cercada e destruída por navios bizantinos. Os eslavos sob os ávaros tentaram atacar as muralhas marítimas do outro lado do Corno de Ouro, enquanto o principal exército ávaro atacou as muralhas terrestres. As galeras do patrício Bono abalroaram e destruíram os barcos eslavos; o ataque terrestre ávaro de 6 a 7 de agosto também falhou.[35] Com a notícia de que Teodoro havia triunfado decisivamente sobre Saíno (supostamente levando Saíno a morrer de depressão), os ávaros recuaram para o interior dos Bálcãs em dois dias, para nunca mais ameaçar Constantinopla seriamente. Embora o exército de Sarbaro ainda estivesse acampado em Calcedônia, a ameaça a Constantinopla havia acabado.[36][37] Decepcionado com o fracasso de Sarbaro, Cosroes II enviou um mensageiro com uma carta para Cardarigano, que era o segundo em comando do exército sassânida. A carta dizia que Cardarigano deveria matar Sarbaro e levar seu exército de volta a Ctesifonte, mas os portadores da carta foram interceptados na Galácia por soldados bizantinos, que entregaram a carta ao futuro imperador Constantino III, que por sua vez a entregou a Heráclio. Depois de ler a carta, se ofereceu para mostrar a carta a Sarbaro em uma reunião em Constantinopla. Sarbaro aceitou sua proposta e encontrou Heráclio na capital, onde leu a carta e passou para o lado de Heráclio.[38] Sarbaro então mudou o conteúdo da carta, afirmando que Cosroes II queria 400 oficiais mortos, garantindo que Cardarigano e o resto do exército permanecessem leais a ele.[39] Sarbaro então deslocou seu exército para o norte da Síria, onde poderia facilmente decidir apoiar Cosroes ou Heráclio a qualquer momento. Ainda assim, com a neutralização do general mais habilidoso de Cosroes, Heráclio privou seu inimigo de algumas de suas melhores e mais experientes tropas, enquanto assegurava seus flancos antes de sua invasão do Irã.[40] Derrubada de Cosroes IIEm 627, Cosroes enviou uma carta a Sarbaro, dizendo que deveria enviar seu exército para Ctesifonte. Sarbaro, no entanto, desobedeceu e mudou-se para o Assuristão, onde montou um acampamento em Ardaxir-Cuarrá. Cosroes então enviou Farruquezade para negociar com ele, mas Farruquezade fez uma conspiração secreta contra Cosroes e juntou-se a Sarbaro.[41] Um ano depois, as famílias nobres do Império Sassânida, cansadas da guerra contra os bizantinos e das políticas opressivas de Cosroes, libertaram o filho do xá, Siroes, que havia sido preso por seu próprio pai. As famílias incluíam: o próprio Sarbaro, que representava a Casa de Mirranes; a Casa de Ispabudã representada pelo aspabedes Farruque Hormisda e seus dois filhos Rustã Farruquezade e Farruquezade; a facção armênia representada por Basterotes II Bagratúnio; e finalmente o canaranges Canara.[42] Em fevereiro, Siroes, junto com Gusdanaspa, capturou Ctesifonte e aprisionou Cosroes II. Siroes então se proclamou xá do Império Sassânida em 25 de fevereiro, assumindo o nome de reinado de Cavades II. Com a ajuda de Perozes Cosroes, executou todos os seus irmãos e meio-irmãos, incluindo o filho favorito de Cosroes II, Merdasas. Três dias depois, ordenou que Mir Hormisda executasse seu pai. Com o acordo dos nobres do Império Sassânida, Cavades II fez as pazes com o imperador Heráclio; sob os termos desta paz, os bizantinos recuperaram todos os seus territórios perdidos, seus soldados capturados, uma indenização de guerra, juntamente com a Vera Cruz e outras relíquias que foram perdidas em Jerusalém em 614.[43][44] Após a perda de território necessária para o tratado de paz, a aristocracia amargurada começou a formar Estados independentes dentro do Império Sassânida. Isso dividiu os recursos do país. Além disso, barragens e canais ficaram abandonados, e uma praga devastadora irrompeu nas províncias ocidentais do Irã, matando metade da população junto com Cavades II, que foi sucedido por Artaxer III.[10] UsurpaçãoApós a morte de Cavades II, Heráclio enviou a Sarbaro uma carta dizendo:
Em 27 de abril de 630,[46] Sarbaro sitiou Ctesifonte com uma força de seis mil homens. Foi, no entanto, incapaz de capturar a cidade, e fez uma aliança com Perozes Cosroes, o líder da facção parsigue (persa), e o ministro anterior do império durante o reinado do pai de Artaxer, Cavades II. Também fez uma aliança com Nandar Gusnaspe, que o sucedeu como aspabedes de Ninruz em 626.[47] Sarbaro, com a ajuda dessas duas figuras poderosas, capturou Ctesifonte e executou Artaxer III junto com muitos nobres sassânidas, incluindo o ministro Ma-Adur Gusnaspe. Sarbaro então se tornou o novo xá do Império Sassânida,[48] e matou Cardarigano, que se opôs à usurpação.[49] Heráclio também reconheceu o filho cristão de Sarbaro, Nicetas, como seu herdeiro. Um cristão iraniano como herdeiro do Império Sassânida abriu as chances de cristianização do país.[50] Depois de algum tempo, Sarbaro mandou crucificar Xanta, filho do ex-ministro financeiro Iasdim, em uma igreja em Marga.[51] A razão desta execução foi alegadamente porque este último insultou Sarbaro durante o reinado de Cosroes II.[52] Quarenta dias depois, em 9 de junho de 630, durante uma cerimônia, Sarbaro foi morto por um dardo lançado por Farruque Hormisda, que então ajudou Borana, a filha de Cosroes II, a subir ao trono.[53][54] LegadoSarbaro desempenhou papel importante na Guerra Bizantino-Sassânida de 602-628 e nos eventos que ocorreram após a guerra; seu motim contra Cosroes II fez com que o Império Sassânida caísse em uma guerra civil. Após a morte de Sarbaro, seu filho Sapor-i Sarbaro depôs Borana e tornou-se xá. Seu reinado, no entanto, não durou muito, e foi logo deposto pelos nobres.[55] Durante o mesmo período, Nicetas entrou a serviço dos bizantinos, e mais tarde apareceria como um dos generais bizantinos na Batalha de Jarmuque durante as guerras bizantino-árabes.[8] Uma saga detalhada de heroísmo e romance evoluiu em torno de Sarbaro mais tarde. No período islâmico, foi transferido à lenda de Omar ibne Anumane e seus filhos que foram incluídos nas Mil e Uma Noites, influenciando o épico bizantino tardio de Digenis Acritas.[56] Referências
Bibliografia
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