O Pato Selvagem
O Pato Selvagem (Vildanden, no original em norueguês) é uma peça de teatro do dramaturgo norueguês Henrik Ibsen, escrita e publicada em 1884, e representada em 9 de janeiro de 1885, no "Den Nationale Scene"[2], em Bergen. Características da obraImediatamente posterior a “Um Inimigo do Povo”, escrita dois anos antes, e que mostrara os dois lados da questão da verdade absoluta, o drama em 5 atos “O Pato Selvagem” resgata a “mentira necessária”, apresentando um tipo de humanidade que não poderia viver sem certas mentiras. Esta peça, cujos personagens alcançam características shakespereanas, tem sido considerada pela crítica como a mais profunda de Ibsen, utilizando “a fábula engenhosa do pato ferido que mergulha até ao lodo do fundo, nele firma o bico, se retém no sargaço, e nunca mais reaparece à superfície, a menos que um cão hábil o faça subir”,[3] Ibsen aborda tragicamente a fragilidade humana, cuja felicidade é destruída pelo fanatismo idealista da verdade absoluta, criando uma obra que se aproxima do espírito cético do teatro contemporâneo, descomprometido com o “salvacionismo moral” da literatura pós-romântica europeia.[4] Sumário“O Pato Selvagem” apresenta Hjalmar Ekdal, poeta frustrado, que vive, sem o confessar nem a si mesmo, do dinheiro do antigo amante da sua mulher e pai de sua filha. O confuso personagem Gregers Werle, “fanático da verdade”, destrói a mentira, e como consequência, arruína a vida rotineira do casal e causa o suicídio da filha. O vencedor da peça é, portanto, a “mentira vital”, sem a qual os homens não podem viver. Personagens
EnredoATO IO primeiro ato se passa na casa de Werle, durante um jantar oferecido a seu filho Gregers, que chegou. Inicialmente Petersen e Jensen estão arrumando o gabinete de trabalho de Werle, e comentam sobre o jantar que Werle está oferecendo em homenagem à chegada de seu filho, Gregers. Repentinamente, chega um senhor, o velho Ekdal, que pede para ir até os escritórios, o que lhe é permitido. Petersen comenta que o velho já fora tenente, mas entrara no comércio de madeiras e “pregara uma peça” no sócio, sendo então preso. Chegam Werle e os convidados para o jantar, entre eles Hjalmar Ekdal e a Senhora Soerby. Hjalmar Ekdal comenta, com Gregers, que durante o jantar eram treze à mesa, e que ele não deveria lhe ter mandado o convite, ao que Gregers retruca, pois se sentira no direito de convidá-lo, como seu velho amigo de escola. Hjalmar sente que o velho Werle não se sentiu satisfeito com sua presença. Gregers e Hjalmar conversam sobre suas vidas ao longo dos anos que não se viram, e Hjalmar diz se sentir satisfeito como fotógrafo, e fala de sua vergonha sobre o acontecido com seu pai, e das dívidas que tinha com o velho Werle. Relata que Werle o ajudou financeiramente, para surpresa de Gregers, e que só pôde se casar graças a ele. Gregers indaga sobre a esposa de Hjalmar, e descobre que é Gina Hansen, que fora governanta da casa durante a doença da Sra. Werle. Gregers fica surpreso, e pede detalhes desse relacionamento, e percebe que fora seu pai quem incentivara tal casamento, assim como fora seu pai a incentivar Hjalmar a ser fotógrafo, aliado ao fato de Gina ter feito alguns estudos de retoque. A Sra. Soerby entra no gabinete, trazendo consigo os outros convivas. Todos conversam, mas Hjalmar não participa muito da conversa. O velho Ekdal, repentinamente, sai do escritório, acompanhado de Graberg, e ambos saem do gabinete. Hjalmar estremece quando vê o pai, e disfarça, dizendo aos convivas não conhecê-lo. Gregers se surpreende por Hjalmar renegar o pai. Hjalmar despede-se e se retira. Gregers fala a sós com seu pai, cobrando-lhe o fato de ter deixado a família Ekdal decair tanto, haja vista já terem sido tão amigos. Werle os culpa por ter sujado seu nome, mas Gregers observa que o velho Ekdal não trabalhara sozinho; o pai nega, pois fora absovido, enquanto o velho Ekdal fora condenado. Werle observa que ainda ajuda o velho Ekdal, dando-lhe pequenas cópias do escritório para fazer. Gregers observa que o casamento de Hjalmar com Gina fora conveniente, pois ela era amante de Werle. Werle desconversa, e faz uma proposta de sociedade com Gregers, pois está com um problema progressivo de visão, e quer o filho em seu lugar. Confessa também que talvez se case com a Sra. Soerby, e Gregers aceita o fato. Gregers se mostra desencantado com o pai, e esse comenta que ele o vê pelos olhos da falecida mãe. Gregers se despede, decepcionado pelas atitudes do pai, em especial com Hjalmar. ATO IIO segundo ato se passa no atelier de Hjalmar Ekdal. Gina e Hedvig estão sentadas, a primeira cosendo e a segunda lendo. Elas conversam e comentam sobre o convite para o jantar que Hjalmar recebera. Hjalmar chega, falam superficialmente sobre o jantar. O velho Ekdal entra, fumando um cachimbo. Conversam sobre o jantar, respondendo às perguntas curiosas de Hedvig. Hedvig lhe cobra sua promessa, mas Hjalmar só lhe presenteia com um cardápio da festa que traz em seu bolso. Falam sobre a falta de clientes para fotografar. Hedvig lhe traz a flauta e ele toca para elas. Gregers chega e diz ter deixado a casa paterna. Conhece Hedvig, e Hjalmar relata seu amor e sua preocupação por ela, pois está para perder a visão. Acreditam ser um problema hereditário, talvez herdado da mãe de Hjalmar. Gregers interroga sobre a idade de Hedvig e sobre o tempo de casamento de Gina e Hjalmar, por volta de quinze anos. O velho Ekdal entra e Gregers conversa com ele, sobre as antigas caçadas que fizera, quando tenente. Ekdal insiste e mostra a Gregers um pato selvagem que cria no sótão da casa. Hedvig diz que o pato é seu, e que ele foi abatido por Werle, mas que esse, por enxergar mal, apenas o feriu, impedindo-o de voar. O pato foi ao fundo do lodo, sendo trazido por um cão que mergulhou. O velho Ekdal observa que os patos selvagens fazem isso: “vão ao fundo tanto quanto podem, seguram-se com o bico nas ervas marinhas e nos juncos... e em todas as sujeiras que acham lá em baixo... e nunca mais sobem[5]”. Gregers se oferece para ficar no quarto que os Ekdal têm para alugar, e Hjalmar aceita. Gina fica preocupada com a situação. Gregers brinca, dizendo que não gostaria de ser Gregers Werle e sim um cão inteligente, desses que trazem os patos selvagens do fundo da lama. Fica combinado que Gregers ficará com o quarto. Hjalmar fica contente, e insinua para Gina que tem uma “tarefa” a cumprir. ATO IIIO terceiro ato se passa no atelier de Hjalmar. Ele retoca uma fotografia e Gina entra. Os dois conversam sobre Gregers no novo quarto. Hjalmar conta que convidou Gregers, Molvik e Relling (que moram nos quartos alugados) para o almoço. Gina sai e entra o velho Ekdal; os dois conversam e mais tarde passam a trabalhar em um projeto “secreto”. Gregers chega e conversa com Hedvig, observando-a, perguntando de suas atividades, quase todas solitárias, pois devido ao problema visual, não freqüenta mais a escola. Ela lhe conta dos livros que têm em casa, que foram deixados por um antigo hóspede, o “holandês voador”, e relata que seu pai deseja que ela aprenda a “fazer cestos”, o que não a agrada. Falam sobre o pato selvagem. Gina chega e as duas arrumam a mesa para o almoço. Enquanto conversam, ouvem um tiro no sótão., e Hedvig informa que estão caçando. Hjalmar desce, com uma pistola de cavalaria, que depois é guardada em uma prateleira. Ele segreda a Gregers estar fazendo, no sótão, uma “invenção”, e que com isso tentará “resgatar” a dignidade do pai. Confessa que o pai, e ele mesmo, já pensaram em tirar a vida com aquela pistola, devido a todo o processo por que passaram. Hjalmar faz segredo sobre a sua “invenção”, sua “descoberta”. Gregers o compara ao “pato selvagem”, mergulhado nos sargaços para morrer na obscuridade. Gina e os outros chegam, e sentam-se para o almoço. Relling comenta dos tempos passados, quando Gregers andava entre os operários com uma coisa que chamava de “os direitos do ideal”. Durante a conversa, Gregers acaba se exaltando, insinuando que naquele lugar há “o mau cheiro dos pântanos”. Os demais acabam interpondo-se, e repentinamente, alguém bate à porta. O Sr. Werle chega. Werle quer falar com Gregers a sós, e os outros saem. Os dois discutem; Gregers informa que está decidido a abrir os olhos de Hjalmar, e que está convicto que deve salvá-lo da mentira e da dissimulação em que está envolvido. Acusa o pai de ter feito uma “armadilha” para o velho Ekdal, e recusa tudo o que o pai lhe oferece, inclusive a sociedade, e Werle se retira. Gregers convida Hjalmar para um passeio, para que possam conversar. Gina e Relling ficam preocupados; Relling observa que Gregers está atacado de febre de “justiça aguda”. ATO IVO quarto ato se passa no atelier de Hjalmar. Gina e Hedvig estão preocupadas com a demora de Hjalmar. Ele chega, diferente de seu modo usual, e durante a conversa, diz que não colocará mais os pés no sótão, e que não deveria receber sob seu teto nada vindo “daquelas mãos”. Fala para Hedvig, para seu desespero, que gostaria de matar o pato selvagem, mas que ele será poupado. Pede para Hedvig sair. Hjalmar questiona, com Gina, sobre os gastos da casa, chegando à conclusão de que Werle é que os ajuda. Depois, questiona se havia algo entre ela e Werle na época em que ela era sua criada. Gina confessa, na época, ter cedido a Werle, e conversam sobre o seu relacionamento. Hjalmar acusa o passado de Gina. Gregers chega. Gregers vem conferir se Hjalmar percebeu e confrontou a realidade., e acredita que a percepção da verdade lhes dará um novo caminho, liberto da mentira. Conversam, e Gregers compara Hjalmar ao pato selvagem, o troféu de caça do Sr. Werle. Relling entra. Gregers diz querer fundar uma “verdadeira união conjugal”, e Relling o questiona, e pede para deixarem Hedvig fora dessa situação de confronto, pois ela está numa idade susceptível a todas as inspirações. A Sra. Soerby chega. Gregers informa que a Sra. Soerby vai casar com seu pai. Soerby confesssa que sim. Relling fica decepcionado. Todos conversam, e Soerby informa que Werle está próximo de perder a visão. Hjalmar diz que pagará toda a sua dívida com Werle, e Soerby se despede. Gregers fica satisfeito com a atitude de Hjalmar. Hjalmar mostra-se revoltado. Hedvig chega e diz ter recebido um grande envelope da Sra. Soerby. Hjalmar lê a carta, que é uma espécie de doação, informando que o velho Ekdal não mais precisará trabalhar, basta ir mensalmente ao escritório para receber 100 coroas por mês, até sua morte, quando a quantidade passará para Hedvig. Hedvig fica exultante. Gregers observa que é uma armadilha para Hjalmar. Hedvig, sem entender o que se passa, sai chorando. Hjalmar rasga a carta, e acusa Gina de infidelidade, depois questiona se Hedvig é sua filha. Gina diz não saber. Hjalmar se revolta, diz não ter mais filha e se veste para sair, para decepção de Gregers, que deseja que ele reflita. Hedvig chega e corre para ele, que a afasta. Hjalmar sai e Hedvig chora. Gina sai à procura de Hjalmar e Hedvig fica com Gregers. Hedvig conversa e não entende o que pode ter acontecido. Gregers tenta clarear os pensamentos de Hedvig, e lhe sugere que sacrifique o pato selvagem — o que tinha de mais preciosos no mundo –, por livre e espontânea vontade, pelo pai. Hedvig diz que vai pedir ao avô que o faça. ATO VO quinto ato se passa no atelier de Hjalmar. Gina e Hedvig procuram por Hjalmar, quando Gregers chega e diz que ele deve estar no quarto de Relling. Relling chega e assente, diz que Hjalmar está dormindo, depois discute com Gregers, questionando o quanto Hjalmar poderá superar tal situação, que Gregers está superestimando as forças de Hjalmar, apenas um homem comum, e que a “mentira vital” lhe poderia ter sido o princípio estimulante. Relling cofessa estimular tais “mentiras vitais” em várias pessoas, inclusive Molvik e o velho Ekdal, para que possam continuar vivendo. Observa que tirar a mentira vital de um homem comum pode significar tirar a sua felicidade. Gregers questiona Hedvig por não ter executado o pato selvagem, e sai. Chega o velho Ekdal, e Hedvig o convida a ir à caça, o que ele recusa, devido ao mau tempo. Hedvig lhe pergunta como ele mataria um pato selvagem, e o avô diz que lhe meteria um chumbo no peito. Ekdal sai, e Hedvig examina a pistola que está na prateleira. Quando Gina chega, ela disfarça. Hjalmar chega, Hedvig tenta abraçá-lo, ele a rejeita. Hjalmar e Gina discutem, ele acusa seu passado. Hedvig entra no atelier, e Hjalmar diz que deve ser poupado da presença de intrusos. Hedvig sai, murmurando algo sobre o pato selvagem. Pega a pistola às escondidas e vai para o sótão. Hjalmar diz que vai embora, e levará apenas seu pai. Gregers chega, questionado sobre o que Hjalmar resolveu, mas ele está desesperado, diz que vai embora, e que não continuará coma sua “invenção”, que fora apenas sugestão de Relling. Fala que Hedvig obscurecerá toda a sua existência. Gregers o questiona. Hjalmar questiona tudo em sua vida, inclusive o amor de Hedvig. Ouvem o pato selvagem gritar no sótão, e Gregers sugere que ele terá a prova do amor de Hedvig. Ouve-se um tiro, e Gregers fica feliz, diz que é a prova de que Hedvig o ama, que a menina convenceu o avô a matar o pato selvagem como prova de seu amor pelo pai. Todos procuram por Hedvig. Hjalmar fica satisfeito e acredita que agora uma nova vida começará para ele. O velho Ekdal chega e nega ter dado o tiro. Correm para o sótão e encontram Hedvig caída. Constatam que o tiro atingiu o coração e que teve morte instantânea. Hjalmar chora, arrependido, dizendo que nunca a deixou de amar. Hjalmar e Gina se consolam. Relling acha que não foi acidente, que ela se matou. Gregers e Relling conversam sobre Hjalmar, o primeiro acreditando na libertação pela morte da menina, e o segundo desacreditando. Gregers reconhece que, se estiver errado, a vida não vale a pena ser vivida, e resolve ser o “décimo terceiro à mesa”. Relling, cético, desfaz dele: “Ora! Vá cantar noutra freguesia![6]”. HistóricoO Pato Selvagem, apesar de planejado por algum tempo, começou a ser esboçado realmente em 20 de abril de 1884, e o quinto e último ato foi feito entre 9 e 13 de julho. Em 2 de setembro de 1884 Ibsen enviou o manuscrito para o editor Hegel. A peça foi publicada pela primeira vez em 11 de novembro de 1884 pela Gyldendalske Boghandels Forlag (F. Hegel & Son), em Copenhague e Christiania em uma tiragem de 8000 exemplares. Os revisores e leitores ficaram bastante intrigados com a peça; apesar disso, o livro vendeu muito bem, e uma segunda edição, de 2000 exemplares, foi publicada em 1º de dezembro de 1884. EstreiaA peça teve sua primeira apresentação em 9 de janeiro de 1885, no Den Nationale Scene, em Bergen. A produção foi um sucesso, em grande parte devido ao seu diretor, Gunnar Heiberg. Dois dias depois, foi aprtesentada pela primeira vez no Christiania Theater. Durante o mês de janeiro também foi produzida no Svenska Teatern, em Helsingfors (16 de janeiro), em Aalborg (25 de janeiro) e no Dramaten, em Estocolmo (janeiro de 30). Três atrizes da época a interpretar Hedvig foram: Lully Krohn (Noruega), Lotten Seelig (Suécia) e Betty Hennings (Dinamarca). O Pato Selvagem em LondresO Pato Selvagem (The Wild Duck) foi representado em Londres, numa produção da Independent Theatre Society, em 5 de maio de 1894. Os atores principais foram Charles Fulton como Gregers, Abingdon como Healmar Ekdal, Herbert Waring como Geria, Winifred Fraser como Hedrig e Lawrence Irving como Relling[7]. Considerações críticasConde Prozor, no prefácio à obra defende que “em nenhuma obra de Ibsen o caráter especial de seu gênio se desenha tão nitidamente como em O pato selvagem”[8]. Observa, também, que “... o antagonismo entre essas duas personagens em cena (Gregers e Relling), não é mais do que um reflexo do combate que se feriu na sua alma (de Ibsen), e ao qual devemos a mais pessimista das suas obras[9]”. Otto Maria Carpeaux, em seu estudo crítico da obra de Ibsen, defende que “O Pato Selvagem” é a “peça mais profunda de Ibsen. A caracterização das personagens atinge alturas shakespereanas[10]”. Carpeaux observa, também, que “o vencedor da peça é a “mentira vital”, sem a qual os homens não podem viver, e que o “coro” da peça, o cínico Dr. Relling, proclama ser a suprema lei da humanidade[11]” Traduções em língua portuguesa
Espetáculos no Brasil1999
2010
Espetáculos em Portugal2016
Referências
Referências bibliográficas
Ligações externas
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