Higino João Pio
Higino João Pio (Itapema-Santa Catarina, 11 de janeiro de 1922 — Florianópolis-Santa Catarina, 3 de março de 1969) foi um comerciante, político e hoteleiro brasileiro.[1] Foi o primeiro prefeito de Balneário Camboriú, no Litoral Norte de Santa Catarina. Pio foi assassinado pela ditadura militar brasileira, que forjou o seu suposto suicídio em 1969.[2] BiografiaHigino João Pio, filho de Tarcília Maria Simaes e João Francisco Pio, nasceu no interior de Santa Catarina, na cidade de Itapema. Ainda jovem, mudou-se para Camboriú com o intuito de trabalhar. Em 1965, tornou-se o primeiro prefeito eleito de Balneário Camboriú, pelo Partido Social Democrático (PSD), assim que o local se desmembrou de Camboriú e foi elevado à categoria de município.[carece de fontes] Pio foi morto aos 47 anos, ainda no exercício do cargo, por agentes da ditadura militar, na Escola Aprendizes de Marinheiro, em Florianópolis., e deixou três filhos.[3] É lembrado pelos conhecidos e cidadãos da época como uma pessoa simples, muito carismática e agradável.[carece de fontes] Carreira como comerciante e empreendedorPio chegou a trabalhar em empresas da cidade de Itajaí, em Santa Catarina. No entanto, ele se firmou como hoteleiro em Balneário Camboriú, antes de entrar para a vida política. Sua hospedaria, o Hotel Pio, construído em 1951, segundo seu filho caçula, Julio Cesar Pio, possuía dez apartamentos completos, com 26 quartos simples, além de um restaurante anexo.[4] Além disso, Higino também foi dono da Imobiliária Maresol, junto a outros dois sócios. Em sua trajetória como empreendedor, ele também chegou a ser proprietário de uma transportadora, pela qual carreava produtos como cebola, carne, batata, entre outros.[4] PersonalidadeSegundo Ademar Silva, amigo da família Pio, Higino era muito conhecido na região de seu nascimento e "muito bem quisto entre os pescadores". Carlos Alberto Schlup, outro conhecido, disse que o ex-prefeito "tratava todos da mesma forma, sem distinção". Já Antonio Jorge de Borba, morador e funcionário do Hotel Pio, declarou que o ex-prefeito costumava se referir a outras pessoas de forma carinhosa, chamando-as de "querido" e "meu filho", por exemplo.[4] "Seo Pio", como era conhecido entre as crianças, também era muito querido pelas crianças da região de Balneário Camboriú. De acordo com relatos de cidadãos, era comum ver o itapemense distribuir balas e doces para os jovens do município.[4] Carreira políticaHigino João Pio fazia parte da União Democrática Brasileira (UDN), porém, o PSD acabou conseguindo levar o futuro prefeito para o partido antes das eleições, acirrando as disputas políticas.[4] De acordo com relatos de pessoas próximas, Pio não gostava de falar em público devido à sua timidez. Por conta disso, ele não possuía uma boa habilidade como orador e acabava recorrendo a amigos para falar por ele em palanques.[4] Foi dos conhecidos, inclusive, a ideia de lançar Higino Pio como candidato à prefeitura. Mesmo tendo pouca experiência na política, já que era comerciante, Higino Pio era uma pessoa muito popular e querida pelos cidadãos. Então, ele acatou ao movimento e concorreu ao cargo, tendo sido, posteriormente, eleito para governar o município.[4] Prisão e MorteJá prefeito de Balneário Camboriú, Higino e outros funcionários da prefeitura foram detidos por agentes da Polícia Federal na quarta-feira de cinzas de 1969, dia 19 de fevereiro, e levados para a Escola Aprendizes de Marinheiro, em Florianópolis.[2][5] O político e comerciante foi preso sem qualquer motivo aparente e, principalmente, sem mandado judicial. A justificativa, portanto, seria relacionada a disputas políticas, com o principal fator sendo o contato do prefeito com o ex-presidente João Goulart.[2] Além disso, outra explicação dos militares para a prisão de Higino Pio foi o combate à corrupção. O prefeito era acusado de doar terrenos da prefeitura para construção de casas populares, usar dinheiro público para comprar caixas de uísque e pagar despesas falsas a familiares.[6] Durante todo o período de sua detenção, Higino ficou incomunicável e não podia ser visitado por familiares ou conhecidos. Depois de alguns dias de interrogatório, os funcionários apreendidos foram liberados do cárcere, exceto o prefeito do município catarinense.[2][5] Então, no dia 3 de março de 1969, a família do itapemense recebeu a notificação de sua morte. Teria sido encontrado já sem vida em um dos banheiros da Escola, com as portas trancadas pelo lado de dentro e enforcado com um arame que era utilizado como varal de roupa, amarrado em uma torneira.[2][5] Segundo laudo necroscópico, assinado pelos médicos-legistas José Caldeira Ferreira Bastos e Léo Meyer Coutinho, a causa do falecimento de Higino João Pio foi suicídio.[2] Investigação e Conclusão da Comissão Nacional da VerdadeO maior problema da versão dos laudos periciais e necroscópicos eram as fotos tiradas da cena. Nas imagens, Higino João Pio aparecia com os pés completamente apoiados no chão, refutando a versão do enforcamento pelo arame.[2][5] Com a promulgação da lei que criou a Comissão Nacional da Verdade (CNV), no ano de 2011, o Coletivo Catarinense de Memória, Verdade e Justiça passou a reivindicar a investigação do caso de Higino Pio. Então, em novembro de 2013, a Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright, de Santa Catarina, realizou uma audiência pública em Itajaí para coletar depoimentos sobre o episódio.[5] Então, em junho de 2014, a Comissão Nacional da Verdade e a Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright apresentaram, em sessão na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), em Florianópolis, um novo laudo sobre a morte de Higino João Pio, na tentativa de estabelecer um novo diagnóstico sobre o ocorrido.[2] O documento, assinado pelos peritos Pedro Luiz Lemos Cunha, Mauro José Oliveira Yared, Roberto Meza Niella e Saul de Castro Martins, tinha a intenção de contestar a causa jurídica da morte por enforcamento divulgadas pelas autoridades da época. E a conclusão foi de que, considerando os pontos inconsistentes do caso, não houve enforcamento, mas, sim, homicídio por estrangulamento, causado por agentes do Estado com o objetivo de espalhar terror na população e passar um recado a quem fosse contrário à forma de governo.[2][6] Além disso, segundo o laudo, corpo da vítima foi disposto no local "após a rigidez cadavérica haver se instalado”, expondo a montagem da cena do crime.[2] O médico-legista Léo Meyer Coutinho, um dos responsáveis por ter assinado o laudo necroscópico em 1969, teve o depoimento colhido pela Comissão e disse não se lembrar de ter comparecido à Escola de Aprendizes de Marinheiro para assinar o documento.[2] De todos os dez presos políticos catarinenses mortos durante o período militar, Higino João Pio foi o único morto nas dependências públicas do estado.[2][5] O filho caçula de Higino João Pio, Julio Cesar Pio, afirmou após a conclusão das investigações que sua família nunca acreditou na hipótese do suicídio. Declarou que a versão do forjamento sempre foi a que predominou entre os filhos e esposa.[1] DenúnciasEm julho de 2018, o Ministério Público Federal de Santa Catarina (MPF-SC) denunciou seis pessoas pelo forjamento de Higino João Pio. De acordo com o MPF, não foi possível identificar os responsáveis diretos pela morte do ex-prefeito de Balneário Camboriú, mas, sim, os mandantes do sequestro, que, posteriormente, levaria ao seu assassinato.[6] Os nomes denunciados foram:
Em setembro do mesmo ano, porém, a 7ª Vara Federal de Florianópolis rejeitou a denúncia do Ministério Público Federal, citando a Lei da Anistia, promulgada pelo presidente João Batista Figueiredo em 28 de agosto de 1979. O MPF recorreu da decisão, mas a 8ª Câmara Criminal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) negou o recurso em outubro de 2019, utilizando o mesmo embasamento do parecer em 1ª instância.[7] Casos semelhantesNão foram poucos os casos de suicídio forjados por militares durante o período ditatorial no Brasil. Talvez o mais famoso seja o do jornalista, professor e dramaturgo Vladimir Herzog. Era militante do Partido Comunista Brasileiro e se apresentou voluntariamente ao Destacamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), no quartel-general do II Exército, no município de São Paulo para "prestar esclarecimentos" sobre suas "ligações e atividades criminosas". Então, foi preso, torturado e assassinado por agentes do Estado.[8] Segundo o Laudo de Encontro de Cadáver expedido pela Polícia Técnica de São Paulo, Herzog havia se enforcado com uma cinta do macacão que vestia. Contudo, a vestimenta dos prisioneiros do DOI-CODI não tinha cinto. Além disso, as fotos anexadas no laudo mostravam os pés de Herzog tocando o chão, com os joelhos flexionados. O corpo da vítima também apresentava marcas de estrangulamento.[8] No entanto, segundo o perito da CNV Pedro Cunha, que participou da investigação da morte de Higino João Pio, o caso do ex-prefeito de Balneário Camboriú foi ainda "mais montado" que o de Herzog. De acordo com ele, as evidências do forjamento do jornalista não eram tão abundantes como as do catarinense.[9] Homenagens
Ver tambémReferências
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