GaziGazi[2] (em árabe: غازي; romaniz.: G(h)āzī; "aquele que empreende uma expedição militar", "conquistador")[3] é originalmente a designação de um guerreiro muçulmano que participa na ghazw (em árabe: عزو; romaniz.: ġazw; "expedições militares", "raides" ou "razias"). Após o surgimento do islão, a ghazw passou a ser uma designação para a guerra religiosa, pelo que gazi passou a significar "combatente da causa de Deus" (al-ġāzī; fī sabīli ʾllāh). A palavra relacionada gázua[4] (غزوة; ġazwah) significa batalha ou expedição militar, sendo frequentemente usada para designar especificamente as lideradas por Maomé.[5] No contexto das guerras entre a Rússia e os povos muçulmanos do Cáucaso, iniciadas no final do século XVIII, senão antes, com a resistência do xeque checheno Mansur Ushurma à expansão russa, o termo surge na forma gazavat (em russo: газават).[6] Na literatura anglófona é muitas vezes usado como sinónimo o termo razzia, derivado do francês, que possivelmente tem origem no português arcaico "razia".[carece de fontes] Para um muçulmano era especialmente meritório participar em campanhas contra os não muçulmanos como gazis. Embora o termo não seja mencionado no Alcorão, ele está presente na na coleção de hádice (conjunto de leis, lendas e histórias sobre a vida de Maomé) “al-Kutub as-sitta” ("seis livros"), nomeadamente nos capítulos sobre as virtudes da jihad (guerra santa).[7] Ghazw como raide ou raziaNa cultura medieval beduína, a ghazw[a] era uma forma de conflito bélico limitado, pouco mais do que um assalto no qual se evitavam confrontos diretos e em vez disso se saqueava, principalmente gado. O poeta do período omíada al-Kutami escreveu os seguintes versos: «a nossa vida é fazer raides contra o inimigo, contra o nosso vizinho e contra o nosso próprio irmão, no caso de não encontrarmos mais ninguém para assaltar senão um irmão.»[9][10] O roubo semi-institucionalizado de rebanhos de gado não era praticado apenas por Beduínos; os antropólogos soviéticos adotaram a palavra cazaque barymta para designar práticas similares de nómadas nas estepes da Eurásia.[11] William Montgomery Watt colocou a hipótese de que Maomé achou útil desviar estas refregas contínuas e mortíferas contra os seus inimigos, tornando-os a base da sua estratégia militar.[12] Segundo Watt, a celebrada batalha de Badr (624) começou como uma dessas razias.[13] Como forma de guerra, a razia foi depois imitada pelos estados cristãos ibéricos no seu relacionamento com os reinos taifa;[14] o termo ibérico cavalgada e o anglo-francês chevauchée são praticamente sinónimos do árabe ghazw e referem-se a táticas militares similares.[15][15] No contexto do colonialismo francês, a palavra razzia designava particularmente os raides para saquear capturar escravos entre os povos da África Ocidental e Central. Quando praticada pelos Tuaregues era chamada rezzou. A palavra foi adotada de ġaziya do árabe argelino vernacular e depois passou a designar em sentido figurado qualquer ato de pilhagem na sua forma verbal razzier.[carece de fontes] Os combatentes gazisGazi (em árabe: غازى; romaniz.: ġāzī é uma palavra árabe, o particípio em voz ativa do verbo ġazā, que significa "levar a cabo uma expedição militar ou raide" ou "esforçar-se por", pelo que gazi pode também ter o mesmo significado que mujahid ("aquele que luta"). O substantivo verbal de ġazā é ġazw ou ġazawān, com o sentido de "atacar de surpresa ou com a intenção de pilhar". Quando usado no singular ġazwah refere-se a uma batalha ou raide em particular. O termo gazi data pelo menos do período samânida (séculos IX e X), quando surge aplicado aos mercenários e combatentes da fronteira em Coração e Transoxiana. Mais tarde, até 20 mil gazis participaram nas campanhas na Índia de Mamude de Gásni (r. 998–1002).[carece de fontes] Os guerreiros gazis dependiam das pilhagens para viverem e tinham tendência para o banditismo e sedição nos tempos de paz. As corporações em que se organizavam atraíam aventureiros, zelotas e dissidentes políticos e religiosos de todas as etnias. A certa altura, porém, predominaram os soldados de etnia turca, nomeadamente os escravos turcomanos dos séquitos dos Mamelucos e os guarda-costas dos califas e emires, que subiram nas fileiras da corporação gazi, tendo alguns deles acabado por alcançar o controlo do poder militar, e mais tarde também do poder político em vários estados muçulmanos.[carece de fontes] A ocidente, os gazis turcos faziam continuamente incursões ao longo da zona fronteiriça bizantina, onde se confrontavam com os seus congéneres ácritas gregos e arménios.[nt 2][nt 3] Depois da batalha de Manziquerta (1071) estas incursões intensificaram-se e as corporações de gazis juntaram-se em irmandades semelhantes às ordens de cavalaria cristãs, que tinham como emblemas o barrete branco e a clava. O apogeu dessas associações chegaria durante a conquista mongol, quando muitos deles fugiram da Pérsia e do Turquestão para a Anatólia.[carece de fontes] Como organizações, as corporações de gazis eram fluidas, refletindo o seu caráter popular, e individualmente os guerreiros gazis pertenciam ora a uma ora a outra, dependendo do prestígio e sucesso de um emir em particular, à semelhança dos bandos de mercenários de condotieros ocidentais. Foi dos territórios da Anatólia conquistados durante a ghazw que emergiu o Império Otomano e as suas tradições lendárias, dizendo-se que o seu fundador, Osmã I, tomou a liderança como gazi graças à inspiração do xeque Ede Bali.[carece de fontes] Gazis como título honoríficoEm períodos mais tardios da história islâmica o título honorífico gazi era assumido pelos governantes muçulmanos que demonstrava sucesso notável na expansão dos domínios do Islão. O título acabou por passar a ser exclusivo deles, num processo semelhante ao ao título romano de imperador, que originalmente era dado a um comandante militar vitorioso e depois passou a designar o governante supremo do Estado romano. Os Otomanos foram provavelmente os primeiros a adotar esta prática, e em todo o caso, a instituição da ghazw remonta aos primórdios do seu Estado:[18]
Os primeiros nove líderes otomanos usaram todos gazi como parte do seu nome de trono completo (como muitos outros títulos, a nomeação era adicionada mesmo quando não era adequada ao cargo), e muitas vezes depois disso. No entanto, nunca se tornou um título formal no âmbito do estilo formal do governante,[nt 4] ao contrário do nome Sultão ul-Mujahidin, usado pelo sultão Murade II, sexto soberano da Casa de Osmã (r. 1421–1451), estilizado "Abul Hairate, Sultão ul-Mujahidin, Cã de Cãs, Grande Sultão da Anatólia e Rumélia, e das cidades de Adrianópolis e Filipólis.[carece de fontes] Devido à legitimidade política de que desfrutavam os que ostentavam esse título, os governantes muçulmanos competiam entre eles pela preeminência na ghāziya, com os sultões muçulmanos sendo geralmente reconhecidos como excedendo todos os outros nesta façanha:
Gazi foi também usado como título honorífico no Império Otomano, sendo geralmente traduzido como "o vitorioso", atribuído a oficiais militares de alta patente que se distinguiam no campo de batalha contra inimigos não muçulmanos. Assim, foi conferido, por exemplo a Gazi Osmã Paxá depois da sua famosa defesa de Plevna, Bulgária, em 1877–1878. Alguns governantes muçulmanos do Afeganistão usaram o título subsidiário Padexá i Gazi (Padshah-i-Ghazi) e o título gazi foi também atribuído a Mustafa Kemal Atatürk (1881–1938).[carece de fontes] Atuação dos combatentes gazis na Idade MédiaQuando levadas a cabo no contexto da guerra islâmica, o objetivo da ghazw era enfraquecer as defesas do inimigo como preparação da sua eventual conquista e subjugação. Devido ao facto da ghazw típica não ter normalmente a dimensão e força para atingir objetivos estratégicos militares ou territoriais, a sua ação traduzia-se geralmente em ataques de surpresa rápidos a alvos mal defendidos (por exemplo aldeias), com a intenção de desmoralizar o inimigo e destruir material que pudesse servir de apoio às suas forças militares. Apesar das regras de guerra islâmicas preverem a proteção de não combatentes como mulheres, monges e camponeses (na medida em que não podiam ser massacrados), as suas propriedades podiam ser pilhadas e destruídas e podiam ser presos e escravizados.[21]
Uma boa fonte para o estudo do que acontecia nos raides das ghazws tradicionais são os juristas islâmicos medievais, cujas discussões sobre quais as condutas eram permitidas e quais eram proibidas no decurso das guerras revelam algumas práticas desta instituição. Uma dessas fontes é o “Bidāyat al-Mujtahid wa-Nihāyat al-Muqtasid” de Averróis (século XII), traduzido para inglês no livro “Jihad in Mediaeval and Modern Islam: A Reader” de Rudolph Peters.[23] Gazawat como guerra santa no CáucasoNo século XIX, combatentes muçulmanos no Cáucaso do Norte que resistiam às operações militares russas declaram uma gazawat (entendida como "guerra santa") contra a invasão ortodoxa russa. Embora não seja certo, acredita-se que o académico daguestano islâmico Muhammad Yaragski tenha sido o ideólogo desta guerra. Em 1825, um congresso de ulemás reunido na aldeia de Yarag declarou gazawat contra os russos. O primeiro líder dos resistentes foi Ghazi Muhammad; depois da sua morte, o imã Shamil acabaria por continuar a luta.[24] Durante a Segunda Guerra Chechena (1999–2009), foi também anunciada uma gazawat contra a Rússia.[carece de fontes] Literatura MaghāzīMaghāzī, cujo significado literal é "campanhas", é um termo tipicamente usado na literatura islâmica para as campanhas militares conduzidas por Maomé na fase pós-Hégira da sua carreira. O relato destas campanhas constitui um género particular da biografia profética diferente da Sira (ou Sīrat Rasūl Allāh). Um exemplo famoso desse género é o Maghāzī de Uaquidi (ca. 748–822).[carece de fontes] Termos relacionados
Gazis célebres
Notas
Referências
Bibliografia
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