Foi a primeira vez que a Seleção usou o uniforme com a camisa amarela e o calção azul. Depois da derrota no Mundial de 1950, o uniforme antigo (camisa branca e calção azul usado desde 1919) foi considerado uma das fontes de azar. Em 1953, o professor e jornalista gaúchoAldyr Garcia Schlee venceu outros treze candidatos no concurso para escolha do novo uniforme. Como vencedor recebeu uma cadeira cativa no Maracanã, um estágio como desenhista no extinto jornal Correio da Manhã e uma soma em dinheiro.
A Seleção de 1954 foi dirigida por Zezé Moreira. Foi a primeira vez que a seleção brasileira disputou as eliminatórias. O capitão foi Bauer.[1] O Brasil foi eliminado nas quartas de final e terminou na sexta colocação.[2]
Antes do mundial, o Brasil emendou seis vitórias seguidas, mas o futebol não convencia. A partida de despedida foi uma vitória por 2 a 0 diante da equipe colombiana do Milionários no Maracanã, em que a seleção foi vaiada. Zezé Moreira respondeu: "As vaias injustificadas tiveram para mim a satisfação de evidenciar que os jogadores nacionais estão com a moral elevada. Sim, porque qualquer quadro teria sucumbido, fatalmente, ante tantas manifestações de desagrado.". O jornalista Mario Júlio Rodrigues fez coro: "Bem, o caso é que apareceu um técnico. E com este técnico acabamos conquistando o único título em terras não nossas. Este mesmo técnico que completou onze partidas e não perdeu nenhuma dessas. O que se pode querer mais?".[3][4]
O jornalista austríaco Willy Meisl, irmão de Hugo Meisl, técnico do Wunderteam, analisou um mês antes da Copa do Mundo: "Os que comparecerem ao próximo Campeonato do Mundo não verão Zizinho, Ademir ou Jair. O técnico do selecionado brasileiro, Zezé Moreira, que conduziu o Brasil à vitória no último Campeonato Pan-Americano de Santiago, selecionou novos homens. Construiu poderosa defesa, tendo por base o famoso sistema do Arsenal, da Inglaterra, isto é, um sistema de "marcação por zona". Mas enquanto a defesa brasileira é, indubitavelmente, mais poderosa do que há quatro anos, a linha de avantes não é tão excepcional quanta à sua antecessora. (...) Dizem os brasileiros ser Julinho o melhor ponteiro do mundo, a mesma honra que a Inglaterra reclama a Tom Finney. Dizem os peritos que Julinho é uma mistura de Stanley Matthews e o famoso artilheiro Gunnar Nordahl.[5]
Na saída do Brasil, a delegação foi recebida pelo presidente Getúlio Vargas, que fez um discurso e se despediu da comitiva. No dia 22 de maio, em avião da Panair, o Brasil viajou com uma enorme delegação, que além de vinte dois jogadores, contava com um técnico, um médico, um massagista, um roupeiro e um cozinheiro, o presidente de honra e uma secretaria da CBD, o chefe da delegação e sua secretaria, dois delegados, dois assessores, dois convidados de honra, um jornalista de agências e outro da revista da CBD.
O Brasil estreou nas eliminatórias vencendo o Chile por 2 a 0. Humberto para Baltazar. Julinho para Baltazar.[6] Paraguai 0 a 1 Brasil. Julinho para Baltazar.[7] Brasil 1 a 0 no Chile no Maracanã. Gol de Baltazar em passe de Didi. Humberto foi muito vaiado pela torcida.[8] Na última rodada, 4 a 1 no Paraguai no Maracanã. Pinga para Julinho. 1 a 0. Maurinho para Baltazar. Romerito para Martinez. 2 a 1. Pinga para Julinho. 3 a 1. Didi para Maurinho[9]
A estreia do Brasil foi contra o México. Vitória fácil por cinco a zero. Pinga para Baltazar. 1 a 0. Didi cobrando falta. 2 a 0. Didi a Pinga. 3 a 0. Didi a Pinga. 4 a 0. Didi a Julinho. 5 a 0.[10]
O segundo jogo da seleção brasileira foi contra a Iugoslávia. O empate classificaria as duas equipes, mas o Brasil continuou pressionando, para desespero dos iugoslavos. O engano só foi desfeito quando todos estavam nos vestiários. Após o empate no tempo normal, ocorreu uma prorrogação e os brasileiros acharam que precisariam de um jogo desempate. Milic para Czebec. 0 a 1. Nilton Santos para Didi. 1 a 1.[11] O Brasil não enfrentou a França, a outra cabeça-de-chave do grupo, de acordo com o insólito regulamento do torneio.
Nas quartas de final, a rival foi justamente a sensação do torneio, a Hungria, naquela que ficou conhecida como a Batalha de Berna devido à alta carga de violência do jogo. O craque Ferenc Puskás, machucado, não jogou. Mesmo assim, o Brasil, completamente envolvido pelos rivais que abriram vantagem de dois gols em menos de 10 minutos de jogo. Hidegkuti em rebote da defesa e Kocsis de cabeça em cruzamento de Hidegkuti. Índio sofreu penalti de Buzánszky. Djalma Santos bateu e converteu. 2 a 1. No segundo tempo, Pinheiros cortou um passe de Hidegkuti a Kocsis, penalti polêmico para a Hungria. Lantos bateu. 3 a 1. Didi para Julinho em chute de longa distância. 3 a 2. Após o Brasil diminuir, Nilton Santos e o capitão húngaro Bozsik trocaram agressões e os dois foram expulsos. Julinho foi derrubado na área e o Brasil reclamou penalti. Humberto deu um pontapé em Kocsis e foi expulso. Aos 43 minutos Czibor cruzou e Kocsis de cabeça fechou o marcador. A imprensa brasileira culpou a atuação do árbitro Arthur Ellis alegando que não houve pênalti no terceiro gol húngaro e o quarto tento estaria em impedimento.[12] Após o apito final, houve confusão generalizada entre as duas equipes e a polícia teve de ser chamada para intervir.
A crônica esportiva criticou o técnico Zezé Moreira por ter insistido na escalação do jogador Humberto Tozzi. Zezé respondeu: "Está mais do que provado que Humberto é um grande jogador. O fato de não ter feito gols é um mero detalhe. Válter do Vasco e Evaristo do Flamengo, também andaram perdendo gols contra o Chile. Deixaram de ser grandes jogadores?".[13]Mário Filho: "Zezé Moreira achando que longe do Brasil, quer dizer, longe das vaias, dos jornais, das estações de rádio, Humberto voltaria a ser artilheiro. Chegado o momento botou-o no scratch e justamente contra a Hungria. Humberto não marcou nenhum gol, ficou desesperado, deu um ponta-pé num húngaro e foi expulso de campo".[14]
Em entrevista em 1995, Zezé reconheceu: " Eu fui vítima da falta de conhecimento. Fui treinador na Copa de 54, na Suíça, sem nunca ter ido antes à Europa. Os jogadores, na maioria, também. Tudo foi surpresa.".[15]
O uruguaio Juan Alberto Schiaffino, presente no Maracanaço, se decepcionou com a seleção: "Ao contrário, encontrei o Brasil diminuído. À margem dos aspectos táticos e de seus naturais progressos físicos, entendo que faltou potencial humano. Individualmente considerado, não estava constituído pelos fenômenos de 1950. Alguns poucos titulares daquele torneio, alguns outros que haviam sido reservas e outros jogadores jovens fizeram que não fosse aquela máquina."[16]
O jornalista David Nasser criticou a ausência dos jogadores da Copa do Mundo de 1950: "Por que não convocou Zizinho e Ademir? Com Zizinho e Ademir o Brasil também poderia perder para a Hungria que nos ganhou sem Puskas. Mas isso ainda não sabemos. Não foi posto à prova. Nunca se assistiu realmente a um jogo no qual estivessem frente a frente a força máxima do futebol húngaro e a força máxima do futebol brasileiro. Cá entre nós: Julinho, Zizinho, Ademir, Jair e Maurinho não teriam aberto a defesa húngara?"[17]
Mas o fato é que a sombra do Maracanaço, ainda fresco na memória dos brasileiros, continuava a pairar sobre a Seleção, de forma que muitos dos erros, incluindo a não convocação de vários craques da época (somente seis dos 22 jogadores da Copa de 1950 estiveram no plantel de 1954; desses, apenas Bauer esteve em campo na partida contra o Uruguai), se devem à conduta supersticiosa da delegação, o que também ajuda a explicar o descontrole emocional que levou à briga generalizada contra os húngaros após a derrota nas quartas-de-final.