Alouatta palliata
Alouatta palliata é uma espécie de bugio, um macaco do Novo Mundo do gênero Alouatta, da América Central e Sul. São conhecidas três subespécies, sendo que para alguns autores, Alouatta coibensis, e suas duas subespécies, podem ser consideradas subespécies de A. palliata. Ocorre em diversos países da América Central, sendo uma das espécies de primatas mais comuns dessa região, e na América do Sul ocorre apenas na Colômbia e Equador. É um dos maiores macacos centro-americanos e os machos podem pesar mais de 9,8 kg. Se diferencia das outras espécies do gênero principalmente pela pelagem, que é totalmente negra com um manto de cor dourada nos flancos. Passa a maior parte do tempo descansando e dormindo. As vocalizações podem ser ouvidas a quilômetros de distância. A. palliata vive em grupos que podem ter entre 10 e 20 indivíduos em um sistema de acasalamento poligínico. Indivíduos de ambos os sexos deixam o grupo em que nasceram quando atingem a maturidade sexual, resultando bandos em que os adultos não são parentes. Se alimentam predominantemente de folhas, mas frutos também podem fazer da dieta. É importante para processos ecológicos na floresta, principalmente como dispersor de sementes e germinador. São animais relativamente inativos, e eventualmente utilizam a cauda preênsil para se locomover. A gestação dura 186 dias, e as fêmeas dão à luz a um filhote por vez, que adquire uma coloração igual ao dos adultos com cerca de 3 meses de idade. Embora impactado pela desflorestação, é mais adaptável que outras espécies de primatas centro-americanos, visto sua capacidade de se alimentar de folhas e viver em áreas pouco extensas e por isso, seu estado de conservação é considerado de "baixo risco" pela IUCN. TaxonomiaAlouatta palliata pertence à família de macacos do Novo Mundo Atelidae, que também contém os outros bugios, os macacos-aranhas, os macacos-barrigudos e os muriquis. É membro da subfamília Alouattinae e gênero Alouatta, que são as categorias taxonômicas dos bugios ou guaribas.[1][3] O epíteto específico palliata; é uma referência a pálio, um manto utilizado por anciões na Grécia e Roma Antigas. Três subespécies são reconhecidas:[3]
Duas subespécies adicionais de A. palliata são reconhecidas eventualmente, mas são identificadas, geralmente, como subespécies de Alouatta coibensis. Entretanto, análises com DNA mitocondrial tem se mostrado inconclusivas quanto à posição desses táxons:[3]
Distribuição geográfica e habitatAlouatta palliata é nativo da Colômbia, Costa Rica, Equador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua e Panamá.[3] Em Honduras, Nicarágua, Costa Rica e Panamá, ocorre em todo os locais desses países.[3] Na Colômbia e Equador, é encontrado em um estreito corredor limitado pelo Oceano Pacífico a oeste e pelos Andes, a leste, e também em uma pequena porção na costa do Mar do Caribe, próxima à fronteira com o Panamá.[3] Na Guatemala, A. palliata é encontrado na parte central do país, e no sudeste do México, ao sul da península de Iucatã.[3] Essa espécie é uma das mais habitualmente ouvidas em muitos parques nacionais da América Central, incluindo os Parques Nacionais Manuel Antonio, Corcovado, Monteverde e Soberania.[4][5] Vive em diversos tipos de floresta, incluindo floresta secundária e a floresta semidecidual, mas é mais abundante em áreas de floresta madura e de floresta ombrófila.[6][7] A. palliata é simpátrico com Alouatta pigra, em uma pequena parte de sua distribuição entre a Guatemala e o México, perto da península de Iucatã.[3] DescriçãoA morfologia de A. palliata é similar aquela de outros macacos do gênero Alouatta exceto pela coloração. A. palliata é preto exceto por uma faixa de pelos de cor dourada ou amarela nos flancos, o que acabou resultando no nome popular em inglês (mantled howler, que traduzido ao pé da letra significa “bugio-de-manto”).[8] No entanto, na Costa Rica, estes macacos começaram a ostentar distintas manchas amarelas em suas caudas e pernas, a primeira evidência de uma rápida mudança na pigmentação da pele de primata.[9] Quando os machos alcançam a maturidade, o escroto se torna branco.[10] Fêmeas medem entre 48,1 e 63,2 cm de comprimento, sem a cauda, e machos têm entre 50,8 e 67,5 cm de comprimento. A cauda é preênsil e mede entre 54,5 cm e 65,5 cm de comprimento. Fêmeas adultas geralmente pesam entre 3,1 e 7,6 kg, enquanto os machos têm entre 4,5 e 9,8 kg.[10] O peso médio pode variar significativamente entre populações de diferentes locais.[11] O cérebro de um adulto pesa cerca de 55,1 g, e é menor do que de outros primatas de porte menor, como o macaco-prego-de-cara-branca.[10][12] A espécie compartilha muitas adaptações com outras espécies de bugio à folivoria, que é uma dieta com grandes porções de folhas. Seus molares possuem cristas altas, que ajudam na mastigação das folhas.[13] Machos possuem o osso hióide bem desenvolvido.[14] O osso funciona como uma caixa de ressonância, amplificando as vocalizações dos bugios, que podem ser ouvidas à quilômetros de distância.[14] ComportamentoOrganização socialOs grupos possuem, em média, entre 10 e 20 indivíduos, sendo que têm entre 1 a 3 machos adultos, e 5 a 10 fêmeas adultas, mas alguns grupos podem chegar a ter 40 membros.[4][13] Machos são dominantes sobre as fêmeas, e indivíduos mais jovens tendem a ter uma posição mais elevada na hierarquia.[14] Indivíduos com posição social elevada possuem prioridade na obtenção de sítios de dormida e alimento, e o macho dominante tende a monopolizar as cópulas.[14] Os grupos geralmente são formados por animais não aparentados entre si, pois indivíduos de ambos os sexos deixam o bando após a maturidade sexual.[13] A catação é pouco frequente, mas sua forma e ocorrência está relacionada à hierarquia social, com indivíduos dominantes catando os subordinados.[15][16] A catação geralmente ocorre de forma rápida e tipicamente se resume às fêmeas catando seus filhotes e machos adultos.[17] Interações agressivas entre membros de um mesmo bando não são frequentes.[15] Entretanto, estudos mostram que a agressividade entre grupos ocorre, e tendem a não ser muito observadas por humanos por serem rápidas e em silêncio.[15] Os territórios de A. palliata têm entre 10 e 60 hectares.[13] Grupos não defendem territórios exclusivos, mas em vez disso, vários grupos podem ter seus territórios se sobrepondo ao de outros.[14] Entretanto, se dois grupos se encontram, eles tentam evitar o outro ameaçando e se comportando agressivamente.[14] Em média, os grupos se deslocam cerca de 750 m por dia.[13] Essa espécie possui pouca interação com outras espécies de primatas centro-americanos, mas interações com o macaco-prego-de-cara-branca ocorrem. Elas são geralmente agressivas, e os macacos-pregos são os mais agressivos.[18] Mas, associações amistosas entre os macacos-pregos e bugios podem ocorrer, envolvendo brincadeiras entre juvenis de ambas espécies, e elas podem se alimentar na mesma árvore, aparentemente, ignorando-se.[18] Forrageamento e dietaAlouatta palliata é o primata mais folívoro da América Central. Folhas fazem parte de quase 50% a 75% da dieta dessa espécie de bugio.[4][13] Apesar disso, ele é seletivo com relação às espécies de árvores que se alimenta, e prefere folhas jovens e brotos.[19] Essa seletividade é para diminuir as concentrações de toxinas ingeridas, já que certas folhas de várias plantas contém toxinas.[19] Folhas jovens geralmente possuem menos toxinas e mais nutrientes do que folhas maduras, e também são mais fáceis de digerir.[13][19] Bugios possuem grandes glândulas salivares que ajudam a digerir os taninos das folhas se ligando aos polímeros antes que o bolo alimentar chegue ao estômago.[17] Embora folhas sejam recursos abundantes, elas possuem pouco valor energético.[14] O fato de os bugios basearem sua dieta predominantemente em uma fonte com tão baixo valor energético influencia muito seu comportamento: por exemplo, vocalizações para localizar outros grupos evitando grandes deslocamentos em patrulhas pelo território e passar a maior parte do dia descansando.[14] Embora as folhas tendam a ser a maior parte da dieta de A. palliata, as frutas também pode ter uma grande porção na dieta. Quando disponível, a proporção de frutas na dieta pode ser até 50% e exceder a de folhas.[13] Folhas e frutos de plantas do gênero Ficus possuem preferência.[14] Flores também pode fazer parte da dieta e são ingeridas principalmente em quantidades significativas durante a estação seca.[13][14] Para obter água, A. palliata pode consegui-la dos alimentos, beber diretamente em buracos nas árvores durante a estação chuvosa ou que ficam retidas em folhas de bromélias.[14][20] Tal como as outras espécies de bugios, quase todos os indivíduos possuem visão tricromática.[21][22] É diferente de muitos macacos do Novo Mundo que possuem também indivíduos dentro de uma mesma população com visão dicromática. A visão tricromática exibida pelos bugios está relacionada à preferências da dieta, permitindo distinguir folhas jovens, que são mais avermelhadas, de folhas maduras.[21] LocomoçãoÉ uma espécie diurna e arborícola.[10] Movimentos dentro da floresta incluem o quadrupedalismo (quando andam e correm sobre suportes), “semi-braquiação” (atravessando de galho em galho por meio de alongamento dos membros) e escalada.[23] Eles podem eventualmente saltar.[24] Entretanto, como os outros bugios, é uma espécie relativamente inativa. Dorme ou descansa a noite inteira e cerca de três quartos do dia. A maior parte do período ativo é passado se alimentando, com cerca de 4% do dia gasto com interações sociais.[24] Esta letargia é uma adaptação a uma dieta de baixo valor energético.[14] Usa a cauda preênsil para agarrar ramos enquanto dorme, descansa ou se alimenta.[25] A cauda pode suportar todo o peso do corpo, mas é mais comum se apoiarem com a cauda e ambos os pés.[25] Um estudo mostrou que A. palliata usa rotas conhecidas para sítios de dormida e de alimento, e parece se lembrar de utilizar marcações para encontrar rotas diretas a esses locais.[26] ComunicaçãoA. palliata é conhecido, como os outros bugios, por ser um "macaco gritador". As vocalizações são majoritariamente emitidas pelos machos, principalmente na madrugada e no crepúsculo, mas também são emitidas em resposta a algum tipo de distúrbio.[14] Essas vocalizações são muito altas e podem ser ouvidas a quilômetros de distância.[14] Consistem de grunhidos e repetidos roncos que duram cerca de quatro a cinco segundos cada.[14] A intensidade é amplificada pelo osso hioide, que funciona como uma caixa de ressonância. Os machos possuem o osso hioide 25 vezes maior do que o dos macacos-aranhas, que possuem porte similar. Fêmeas também vocalizam, mas suas vocalizações são mais agudas e não tão ruidosas quanto dos machos.[14] A capacidade de emitir tais chamadas é uma estratégia para diminuir o gasto energético em patrulhas pelo território, consistente com a dieta de baixo valor nutricional dos bugios. Os roncos permitem que esses macacos localizem outros bandos sem se mover muito e evitando confrontos diretos.[14] A. palliata utiliza outros sons para se comunicar, incluindo "latidos", grunhidos, cacarejos e guinchos.[20] Eles utilizam cacarejos para manter contato auditivo com outros membros do mesmo grupo.[27] Também é utilizada comunicação não-vocal, como marcação com urina em alguma situação social estressante.[20] Isto é feito esfregando as mãos, pés, cauda e peito com urina.[20] Beijos e movimentos de língua são sinais usados pelas fêmeas para indicar receptividade sexual.[20] Exibições dos genitais são usadas para indicar estados emocionais, e membros do grupo podem balançar galhos, o que aparentemente é uma atividade lúdica.[20] Os bugios são geralmente indiferentes à presença dos humanos. Entretanto, quando incomodados por seres humanos, eles podem demonstrar irritação urinando ou defecando neles.[14] Fezes e urina podem atingir observadores, apesar dos bugios estarem no alto das árvores.[14] Uso de ferramentasOs bugios eram tido como animais incapazes de usar ferramentas, até que em 1997, foi observado um exemplar de Alouatta seniculus utilizando um galho para acertar uma preguiça-real (Choloepus didactylus), que descansava em uma árvore.[28] Isto sugere que outras espécies do gênero possam usar ferramentas, inclusive A. palliata, apesar de nunca ter sido observado diretamente. ReproduçãoO sistema de acasalamento é poligínico, em que um macho copula com várias fêmeas.[20] Geralmente, o macho alfa monopoliza as oportunidades de cópulas, mas caso ele se distraia, machos subalternos podem conseguir copular.[14] Em alguns grupos, machos subordinados conseguem se acasalar regularmente e deixar descendentes.[13][29] Os machos alfa mantêm seu status por cerca de 2,5 anos até 3 anos, período em que podem ter até mais de 18 filhotes.[10] Fêmeas tornam-se sexualmente maduras com 36 meses de idade, enquanto machos com cerca de 42 meses.[20] Entretanto, as fêmeas terão filhotes a primeira vez com cerca de 42 meses. O ciclo estral é regular, com cerca de 16,3 dias, e apresenta mudanças sexuais na pele, particularmente inchaço e mudança de cor (de branco para rosa claro) nos pequenos lábios da vulva.[30] O ato copulatório começa quando uma fêmea receptiva se aproxima de um macho e inciam lambidas. O macho responde da mesma forma antes da fêmea se virar enquanto levanta os quadris, permitindo o início do coito.[14][20][31] Fêmeas aparentemente utilizam sinais químicos, já que os machos cheiram seus genitais e degustam a urina das fêmeas.[20] A gestação dura cerca de 186 dias; nascimentos podem ocorrer em qualquer parte do ano.[20] A pelagem do recém-nascido é prateado, mas se torna pálida ou dourada depois de alguns dias. Depois disso, a pelagem escurece e o juvenil passa a ter a coloração de um indivíduo adulto com 3 meses de idade.[14] O juvenil é carregado por sua mãe, se pendurando nos pelos do peito, durante as duas primeiras semanas.[20] Depois dessas semanas, é carregado nas costas.[20] Com cerca de 3 meses, ela passa a carregar menos, até mesmo empurrando para fora, mas somente com 4 ou 5 meses que o filhote deixa de ser carregado.[14] Depois que o juvenil passa a andar por si só, a mãe o carrega apenas para atravessar difíceis obstáculos entre as árvores.[20] Eles brincam entre si em grande parte do tempo.[20] Os infantes são desmamados com 1,5 ano de idade e o cuidado maternal termina neste momento.[20] Fêmeas adultas tipicamente dão à luz a cada 19 a 23 meses, depois que a primeira prole sobrevive até o desmame.[13] A. palliata difere dos outros bugios em que os testículos não descem até o escroto até eles alcançarem a maturidade sexual.[17] Quando alcançada a maturidade sexual, os joven adultos deixam o grupo natal, embora a prole de fêmeas de alta posição social podem permanecer no grupo.[14] Entretanto, muitos infantes não alcançam a maturidade sexual: adultos dominantes podem matar os filhotes de adultos subordinados, eliminando a competição entre a prole do dominante com a do subordinado.[14] A emigração ocorre para ambos os sexos, com 79% dos machos e 96% das fêmeas deixando o grupo natal quando se tornam adultos.[32] Quando um macho de fora do grupo consegue ocupar o lugar do antigo macho alfa, ele mata os infantes das fêmeas residentes, que acabam entrendo no estro.[13] Predadores como felídeos, cobras e rapinantes também matam filhotes.[33] O sucesso reprodutivo máximo ocorre em fêmeas de posição social intermediária, com filhotes de indivíduos alfa sobrevivendo pouco, possivelmente por conta de competição, e a mortalidade infantil é menor em bandos que os nascimentos das fêmeas ocorrem de forma sincronizada.[30] Se sobreviver à infância, A. palliata pode viver até 25 anos.[33] ConservaçãoA espécie é considerada como de “baixo risco” pela IUCN. Apesar disso, suas populações têm sido impactadas negativamente pela fragmentação das florestas, que tem forçado a migração de grupos desse macaco para regiões mais remotas. Entretanto, essa espécie pode se adaptar melhor à fragmentação de habitat se comparada aos outros primatas centro-americanos, devido ao seu baixo gasto energético, pequenas áreas de vida e habilidade para explorar outras fontes de alimento além de folhas.[34] Possui importância ecológica por várias razões, principalmente como dispersor de sementes e germinador, já que sementes que passam pelo trato digestório do animal têm maior probabilidade de germinarem.[14] Besouros da superfamília Scarabaeoidea, que também são dispersores de sementes, parecem dependentes da presença de A. palliata.[14] Esse bugio é protegido do comércio internacional através do Apêndice I da CITES.[35] Referências
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