O exposto acima está de acordo com a definição original de Hartley, mas, como também acontece com a transformada de Fourier, vários detalhes são matéria de convenção e podem ser alterados sem mudança nas propriedades essenciais da transformada:
Em lugar de usar a mesma fórmula para a transformada e sua inversa, pode-se remover o da fórmula da transformada e usar 1/2π na inversa — ou, na realidade, qualquer par de fatores de normalização cujo produto seja 1/2π (essas normalizações assimétricas são às vezes encontradas em textos de matemática pura e engenharia, inclusive na transformada de Fourier).
Pode-se também usar 2πν em lugar de ω (isto é, a frequência simples em vez da frequência angular), quando então o coeficiente é totalmente removido. Bracewell (2000) e Olejniczak (2000) são exemplos de autores que seguem essa convenção[1][2].
Pode-se usar cos(t)-sin(t) em lugar de cos(t)+sin(t) como o núcleo.[carece de fontes?].
Como neste verbete a transformada de Fourier desempenha um papel muito importante, vale a pena lembrar que a definição "angular-simétrica" para as transformações direta e inversa é a seguinte:
É essa definição que deve-se ter em mente quando se mencionar aqui a transformada de Fourier. O uso dessa convenção evita a introdução de fatores de escalamento na maioria dos teoremas apresentados.
Relação com a transformada de Fourier
Essa transformada difere da transformada de Fourier clássica na escolha do núcleo. Na transformada de Fourier, é usado o núcleo exponencial , onde i é a unidade imaginária.
As duas transformadas são bastante relacionadas, entretanto, e a transformada de Fourier (assumindo que se use forma simétrica de ambas e o mesmo fator de normalização) pode ser computada a partir da transformada de Hartley através de:
Ou seja, as partes real e imaginária da transformada de Fourier são dadas, respectivamente, pelas partes pares e ímpares da transformada de Hartley.
Inversamente, para funções de valores reais, a transformada de Hartley é dada, a partir das partes real e imaginária da transformada de Fourier, por:
onde e denotam as partes real e imaginária da transformada de Fourier.[1][7]
A transformada de Hartley H(ω) também pode ser obtida a partir da transformada real de Fourier R(ω) por meio da fórmula abaixo:
onde Rp(ω) e Ri(ω) são as partes par e ímpar, respectivamente, de R(ω).[8]
Relações similares existem com a transformada real de Mellin M(σ,ω), outra transformação relacionada à transformada de Fourier:
onde Mp(σ,ω) e Mi(σ,ω) são as partes par e ímpar, respectivamente, de M(σ,ω).[9]
Condições de existência
Uma condição suficiente para a existência da transformada de Hartley de uma função f(x) é que exista a transformada de Fourier dessa função. Outro grupo de condições suficientes são as condições de Dirichlet:
f(x) deve ser absolutamente integrável no intervalo [-∞,∞]
f(x) deve ter um número finito de descontinuidades nesse intervalo
f(x) deve ter um número finito de máximos e mínimos locais em qualquer subintervalo entre -∞ e ∞
Tais condições são suficientes, não necessárias. Funções importantes, como f(x) = cos(x), não atendem às condições de Dirichlet (neste caso, por não ser absolutamente integrável), mas ainda assim possuem uma transformada de Fourier e, por conseguinte, uma transformada de Hartley.[10]
Interpretação da transformada de Hartley
A transformada de Fourier de uma função real f(x) é uma função complexa F(ω) que exibe simetria hermitiana, ou seja F(-ω) = F*(ω), onde F*(ω) denota o conjugado complexo de F(ω). Isso implica que existe uma certa redundância na função F, porque o valor de saída para entradas negativas está totalmente determinado pelo valor para entradas positivas. A transformada de Hartley de f(x), H(ω), não exibe tal comportamento. Isso também se reflete no fato de que F(ω) atribui dois números, um real e outro imaginário, a cada valor de entrada, enquanto H(ω) só atribui um número real.[11]
Propriedades
Linearidade
Por consistir de uma combinação de operadores lineares (a transformada de senos e a transformada de cossenos), a transformada de Hartley é um operador linear e simétrico (Hermitiano). Das propriedades de simetria e auto-inversão (1c), segue-se que a transformada é um operador unitário (na verdade, ortogonal).
Teorema da convolução
Existe também um análogo ao teorema da convolução para a transformada de Hartley. Se duas funções e têm transformadas de Hartley e , respectivamente, então sua convolução tem a transformada de Hartley
onde Yp e Yi são as componentes par e ímpar, respectivamente, de Y(ω).
A expressão (3a) parece complicada, com relação a, por exemplo, o que vale para a transformada de Fourier. No entanto, como em aplicações práticas sempre se pode escolher a origem t=0 de forma a fazer a função f(t) ser par (por exemplo), a expressão (3a) se simplifica para
que é idêntica ao teorema da convolução para a transformada de Fourier.[1]
Paridade
Similarmente à transformada de Fourier, a transformada de Hartley conserva a paridade: a transformada de Hartley de uma função par é sempre uma função par, e a transformada de Hartley de uma função ímpar é sempre uma função ímpar.[1]
Se a transformada de Hartley de f(x) for denotada por H(ω), então a transformada da derivada de ordem n de f será dada por
onde cas' é a função cas complementar (ver abaixo).[14]
Tabela de Transformadas de Hartley
A tabela abaixo traz as transformadas de Hartley de algumas funções comuns em aplicações de engenharia. Como as convenções variam entre representar a transformada como H(ω) ou como H(ν) (sendo que ω = 2πν; ver acima), as duas opções foram contempladas.
Tabela 1 - Transformadas de Hartley de algumas funções f(t)[15]
A série de Hartley é uma expansão em série infinita de uma função periódica f(t), na forma
onde τ é o período de f(t) e os coeficientes ak são números reais. A série de Hartley é idêntica à série de Fourier, apenas com a base ortogonal sendo a função cas(x), e em vista disso exibe propriedades similares e encontra as mesmas aplicações práticas. Em particular, as condições para existência de ambas as séries são as mesmas.
A propriedade de ortogonalidade de cas(x) é sumamente importante, pois garante que o erro quadrático ε2 na representação da função f(t) por meio da série finita
definido por
é o mínimo possível para um dado K e diminui com o aumento de K.[nota 5][nota 6] Em outras palavras, os coeficientes ak fornecem a melhor representação possível de f(t) para qualquer valor de K. Em aplicações práticas, é sempre necessário usar um número finito de coeficientes, e essa propriedade permite ajustar a qualidade da representação e as limitações computacionais.
Outra propriedade importante da série de Hartley é que o erro linear ε, definido como
pode ser feito arbitrariamente pequeno com o aumento de K (ou seja, ε não diminui assintoticamente).[nota 7] Essa propriedade decorre da equação de Parseval
Se g(t) = f(-t), os coeficientes bk da série de Hartley de g(t) estarão relacionados aos coeficientes ak da série de Hartley de f(t) pela expressão para qualquer j.
Paridade
Se f(t) for uma função par, então para qualquer j. Se f(t) for uma função ímpar, para qualquer j.[nota 8] Se f(t) for uma função com anti-simetria de meia-onda, ou seja, , então aj = 0 para j par.
Derivada e anti-derivada
Se denotarmos por g(t) a derivada de f(t), os coeficientes bk da série de Hartley de g(t) estarão relacionados aos coeficientes ak da série de Hartley de f(t) pela expressão para qualquer j.
Se denotarmos por g(t) a anti-derivada de f(t), os coeficientes bk da série de Hartley de g(t) estarão relacionados aos coeficientes ak da série de Hartley de f(t) pela expressão para qualquer j.[19]
A transformada de Hartley é definida em um espaço euclideano contínuo. A Transformada Discreta de Hartley (DHT) expande a definição para um espaço discreto. A DHT de uma sequência f de n valores é uma sequência do mesmo tamanho, com o k-ésimo elemento dado pela fórmula
onde τ é tamanho do período amostrado. A expressão (6a) é muito similar às transformadas discretas de Fourier (DFT), de cosseno (DCT) e de seno. A sequência original é recuperada pela aplicação da transformada inversa, ou seja, os valores fk de f são obtidos a partir dos coeficientes ak pela fórmula:
Perceba-se que a simetria entre a transformada e a inversa é quebrada pelo fator de escalamento 1/n, o que também acontece com a DFT. Poder-se-ia eliminar essa assimetria substituindo esse fator por e introduzindo-o na transformada inversa, mas esse procedimento não é comum. A maioria segue a definição original de Bracewell(2000).
Como a DHT recebe como entrada uma sequência finita de n valores, pressupõe-se que a função sob análise f(t), de onde se originou a sequência f(k), seja periódica, com período igual ou inferior a τ.
As propriedades (2a), (2b) e (3a) também valem para a transformada discreta de Hartley. E, a exemplo de toda transformação discreta, a DHT também está sujeita aos fenômenos de erro de truncamento e serrilhamento (ing. aliasing). Mas a DHT oferece a grande vantagem de não exigir o trabalho com números complexos, o que economiza e simplifica o trabalho. Para um mesmo número de amostras, o cálculo da DHT exige a manipulação de apenas a metade dos valores, quando comparada à DFT, sem que se perca informação com essa simplificação.
A propriedade do valor inicial possui a forma seguinte:
onde ak são os valores da sequência DHT{f(k)} e fk são os valores da sequência f(k).
A propriedade do deslocamento do eixo, correspondente às equações (3e) e (3f) para a versão contínua, deve ser escrita da forma seguinte:
onde bk são os valores da sequência DHT{f(k + m)}, e m é um inteiro entre 0 e n. Na expressão (6e), como se trata de uma convolução cíclica, valores negativos de índices devem ser somados a n de forma a resultar num valor adequado, isto é, um valor na faixa [0,n].
A propriedade da primeira diferença é expressa da forma seguinte:
onde bk são os valores da sequência DHT{f(k + 1) - f(k)}.
O teorema de Parseval deve ser escrito da forma seguinte:
A transformada discreta de Hartley pode ser calculada diretamente a partir da fórmula de definição, mas existem algoritmos otimizados, como a Transformada Rápida de Hartley (FHT, do inglês Fast Hartley Transform). Pela sua relação com as transformadas de Fourier e de cossenos, ela também pode ser computada a partir da DFT, da FFT (Fast Fourier Transform) e de algumas variantes da DCT. Inversamente, a DHT pode ser usada para computar as transformadas discretas de Fourier e de cossenos, além da computação de convoluções discretas.[1]
Transformada de Hartley em duas dimensões
Em aplicações de análise de imagem, pode-se empregar a transformada de Hartley em duas dimensões, ou seja, a transformada de Hartley de uma função f(x,y) de duas variáveis reais independentes. Da mesma forma que no caso unidimensional, existem as versões contínua e discreta da transformada bidimensional.
Transformada bidimensional de Hartley
Essa transformada é definida pela equação
e a inversa por
Existe uma definição similar para a transformada em três dimensões.[14]
Uma variante da transformada bidimensional de Hartley é a transformada CasCas, que utiliza como núcleo a função . Essa possibilidade de optar entre dois núcleos também existe para a transformada bidimensional de Fourier, e representa as duas maneiras diferentes de se esquadrinhar um plano.[1]
Transformada discreta bidimensional de Hartley
Uma imagem representada por uma matriz f com m x n valores reais possui uma transformada discreta de Hartley em duas dimensões dada por outra matriz m x n, que é a transformada discreta bidimensional de Hilbert (DHT2). Os coeficientes aj,k de tal matriz são valores reais, obtidos dos coeficientes f(j,k) pela fórmula
onde τm e τn são o tamanho do intervalo amostrado em cada dimensão. A transformada inversa, aplicada à matriz DHT2, resulta na matriz original f; os coeficientes de f são obtidos dos coeficientes aj,k pela fórmula
Existem definições similares para transformadas em mais dimensões.[1]
Notas
↑Quando aplicada a uma função de valores reais, o que geralmente é o caso.
↑Essa expressão é válida apenas quando se emprega a definição (1a) para a transformada ou substitui-se ω por 2πν. Em outros casos, podem aparecer fatores de escalamento (ver o item Convenções).
↑Uma das desvantagens da transformada de Hartley, em relação à transformada de Fourier, é justamente que a variação do ângulo de fase com a frequência não é tão clara.
↑ abcdefghijklBracewell, R. - The Fourier Transform And Its Applications, 3rd. Edition, New York: McGraw-Hill, 2000, Cap. 12, pp. 293-328,ISBN 978-0-1381-4757-0
↑ abK. Olejniczak - The Hartley Transformin A. Poularikas (org) - The Transforms and Applications Handbook, 2nd. edition, Boca Raton: CRC, 2000, Cap. 3, pp. 342 a 343