Sumak Kawsay Nota: "Buen vivir" redireciona para este artigo. Para outros significados, veja Bem viver (desambiguação).
Sumak Kawsay (também Sumaq kawsay ou Shumaq kawsay, dependendo do dialeto) é um neologismo em quíchua criado na década de 1980 como proposta política e cultural de organizações indígenas e posteriormente adotado pelos governos do movimento pelo socialismo no século XXI no Equador e na Bolívia.[1] O termo refere-se à implementação de um socialismo mais independente das teorias socialistas europeias, estando ligado a um pensamento ancestral e estilo de vida comunitário dos povos indígenas quíchua. No Equador, foi traduzido como "bem viver", embora especialistas na língua quíchua concordem que a tradução mais precisa seria "vida em plenitude".[2] Em aimará, idioma falado em partes da Bolívia, o termo equivalente é "suma qamaña", que é traduzida como "bem viver". Em português, é traduzido frequentemente como "bem viver".[3] Em seu significado original em quíchua, sumak refere-se à fruição ideal e bela do planeta, enquanto kawsay significa “vida”, uma vida digna, em plenitude, equilíbrio e harmonia. Existem noções semelhantes entre outros povos indígenas, como os Mapuche (Chile, Argentina), os Guarani da Bolívia, norte da Argentina e Paraguai que falam de seu teko kavi (boa vida) e teko porã (boa vida ou bom modo de ser), os Achuar da Amazônia equatoriana e os Guna do Panamá. Os povos maias Tsotsil e Tseltal buscam o Lekil Kuxlejal, ou "vida justa e digna", que é considerado equivalente ao sumak kawsay e influenciou no desenvolvimento do Neozapatismo.[4] Desde o fim da década de 1990, o sumak kawsay tem se desenvolvido como um projeto político que visa alcançar o bem-estar coletivo, a responsabilidade social na forma como as pessoas se relacionam com a natureza e o fim da acumulação interminável de capital, sendo uma alternativo ao modelo predominante de desenvolvimento, que encara o ser humano como um recurso econômico. Os movimentos indígenas no Equador e na Bolívia, juntamente com intelectuais, utilizaram inicialmente o conceito para definir um paradigma alternativo ao desenvolvimento capitalista com dimensões cosmológicas, holísticas e políticas. A Constituição do Equador de 2008 incorporou o conceito dos direitos da natureza, assim como a Constituição da Bolívia de 2009. Diversos teóricos, como os economistas Alberto Acosta e Magdalena León, afirmam que o sumak kawsay não se trata de uma teoria acabada e completamente estruturada, mas sim de uma proposta social inacabada que pode ser melhorada.[5] FundamentosO sumak kawsay é uma proposta que se fundamenta em cinco princípios:
De acordo com o filósofo Javier Lajo, na concepção andina o sumak kawsay é o equilíbrio entre o "sentir-se bem" (allin munay) e o "pensar bem" (allin yachay), que juntos resultam no "fazer bem" (allin ruay), ponto onde se alcança a harmonia.[7][8] Apesar disso, o Bem Viver não representa uma proposta monocultural de sociedade, pois "é um conceito plural – bons conviveres [...] que surge das comunidades indígenas".[9]
Esse princípio de vida, que se baseia na cosmovisão dos povos indígenas andinos e nos saberes ancestrais em geral, fundamenta-se em, entre outros, nos pilares:[11]
Influência na legislação do EquadorO conceito de Bem Viver teve uma influência importante na elaboração da Constituição equatoriana de 2008, levando ao desenvolvimento de novas conceitos e leis como os Direitos da Mãe Natureza.[12] Para a Constituição, a natureza deixou de ser um objeto e passou a ser um sujeito autônomo que deve ser interpretado de forma integral com o ser humano. Por exemplo, o artigo 71 da Constituição reconhece que “A natureza ou pachamama, onde a vida é reproduzida ou realizada, tem direito ao pleno respeito da sua existência, assim como a manutenção e regeneração dos seus ciclos vitais, estrutura, funções e processos evolutivos ”.[13] No artigo 275 se especifica que "o Bem Viver exigirá que as pessoas, comunidades, cidades e nacionalidades gozem efetivamente dos seus direitos e exerçam responsabilidades no quadro da interculturalidade, do respeito pelas suas diversidades e da coexistência harmoniosa com a natureza."[14] Os Planos Nacionais de Desenvolvimento de 2009-2013 e de 2013-2017 foram denominados Planos Nacionais para o Bem Viver, estruturados pela Secretaria Nacional de Planejamento e Desenvolvimento (Senplades). O documento para 2013-2017 declara:
Influência na legislação da BolíviaA constituição que "refundou" a Bolívia, rebatizando-a como "Estado Plurinacional", entrou em vigor em 2009.[15][16] O Bem Viver foi introduzido nessa constituição por contribuições de movimentos camponeses/indígenas e pela atuação de personalidades como o ex-ministro das relações exteriores David Choquehuanca e o então presidente Evo Morales, ambos de origem aimará. Essa ideologia aparece enquanto um princípio ético-moral que deve inspirar o Estado, a sociedade e o modelo econômico. O Artigo 8 da Constituição de 2009 afirma que:
O mesmo artigo elenca uma série de valores que sustentam o Estado “para viver bem”:
No segundo artigo da Constituição de 2009 encontra-se o termo "naciones y pueblos indígena originario campesinos" (nações e povos indígena originário camponês), que reúne as três ideias com plural só ao final como se fossem uma única ideia. Este termo é usado para nomear um sujeito social recorrente no texto constitucional, que reflete as identidades híbridas do povo bolivano. O novo sujeito social é definido constitucionalmente no Artigo 30:
Morales e David Choquehuanca se tornaram referências em arenas internacionais de debate sobre a mudança climática, direitos indígenas, entre outros temas, contribuindo para a circulação internacional do conceito do Sumak Kawsay. Essas iniciativas culminaram na realização da Conferência Mundial dos Povos sobre a Mudança Climática e os Direitos da Mãe Terra, realizada em Cochabamba, de 19 a 22 de abril de 2010.[18] Ver tambémReferências
Bibliografia
Ligações externas
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