Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón
Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón (No Brasil, Pepi, Luci e Bom e em Portugal Pepi, Luci, Bom e Outras Tipas do Grupo) é um filme espanhol de 1980. É o filme de estreia de Pedro Almodóvar como diretor. Ele escreveu o roteiro em 1976, quando trabalhava na Telefónica como empregado administrativo, e o reescreveu quando começou a rodagem. O filme, inspirado pela agressiva ideologia punk representada pela personagem Bom (Alaska (cantora)), trata de três garotas (Pepi, Luci e Bom), que vivem em Madri durante o período inicial da movida madrilenha.[2][3] SinopsePepi (Carmen Maura) é uma jovem que vive sozinha em um apartamento de Madri. Ela se dedica a cultivar Cannabis em sua varanda. Um policial que é seu vizinho (Félix Rotaeta) a descobre. Ele invade a casa de Pepi e, em troca de seu silêncio, Pepi aceita ter relações sexuais com ele. Ela pede que ele faça sexo anal, mas ele ignora o pedido e penetra sua vagina, arruinando o negócio que Pepi planejava: a venda de sua virgindade. A garota, então, busca vingar-se com ajuda de sua amiga Bom e seus amigos punks, que decidem dar uma surra no policial. Mas eles se equivocam e acabam agredindo o irmão gêmeo do policial. Pepi acaba conhecendo Luci (Eva Siva), esposa sadomasoquista do policial, natural de Múrcia. Pepi a convence a tomar aulas de tricô. Numa dessas aulas, Luci conhece Bom. Bom urina em Luci, para deleite desta. Luci deixa o marido para se juntar a Bom, que é uma cantora punk com tendências sádicas. Unidas, Pepi, Luci e Bom passam por diversas situações no cenário underground das noites de Madri. Elas cruzam com personagens como: a garota do interior que quer ser modelo e que todos acham que é prostituta (Kiti Mánver); a atriz que está interpretando a dama das camélias e lhes deixa seu filho (Julieta Serrano); a atriz que faz os anúncios das calcinhas Ponte (Cecilia Roth); Toni, o companheiro de Bom no grupo Bomitoni (Carlos Tristancho) etc. Durante uma apresentação deste grupo, Bom dedica, a Luci, o tema musical do filme, "Murciana Marrana". Na festa que se sucede à apresentação, Bom tem de fazer sexo oral no ganhador do concurso de maior pênis "Ereções Gerais". A vida ociosa e divertida que levam termina quando o marido de Luci a espanca e a faz ingressar no hospital. Sobre o filmeO roteiro surgiu originalmente sob o título 'Erecciones Generales', idealizado como uma fotonovela para uma publicação underground e foi adaptado a roteiro cinematográfico por incentivo da atriz Carmen Maura, que participava do mesmo grupo de teatro que Almodóvar, a companhia Los Goliardos. Foi filmado com um orçamento de meio milhão de pesetas, obtidas sobretudo através de empréstimos, durante um período de um ano e meio, com uma equipe de voluntários, trabalhando sobretudo aos fins de semana. Antes de Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón, Almodóvar só tinha realizado gravações em formato 8 milímetros, de pouca notoriedade mesmo nos meios underground, de forma que, sendo gravado em formato 16 mm, este foi seu primeiro filme comercialmente exibido.[4] Almodóvar descreveu o filme como uma história sobre "seres humanos fortes e vulneráveis que se abandonam à paixão, que sofrem o amor e se divertem".[5] Embora continue sendo considerado um filme tecnicamente pobre, assim como o filme seguinte de Almodóvar Laberinto de pasiones, é considerado um documento da movida madrilenha, a cena libertária punk pós-Franco que se desenvolveu principalmente em Madri. Elenco
Maura assumiu o papel protagonista de Pepi e Félix Rotaeta interpretou o policial abusivo. Ambos foram instrumentais na realização do filme. Maura já era uma atriz estabelecida, tendo alcançado o sucesso com o filme Tigres de Papel, de Fernando Colomo.[6] Ela se tornou a atriz de referência da primeira metade da carreira de Almodóvar. Bom é interpretada por Olvido Gara, então uma cantora adolescente punk, que inspirou o personagem que interpreta. Gara continuou a usar o nome artístico de Alaska. Ela alcançou o sucesso como cantora, primeiro com o grupo "Alaska e Dinarama", e depois com o grupo Fangoria.[7][8] Muitos atores que aparecem em papéis menores viriam a interpretar papéis mais importantes nos filmes subsequentes de Almodóvar:[9] Kiti Manver (Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos) interpreta uma cantora de roque andaluza e temperamental; Julieta Serrano (Entre tinieblas); Cecilia Roth (Tudo sobre Minha Mãe); Fabio MacNamara (Laberinto de pasiones), um cantor e pintor, interpreta um travesti;[10] Cristina Sánchez Pascual (Entre tinieblas) aparece como uma mulher barbada frustrada num casamento com um homossexual, numa paródia de Cat on a Hot Tin Roof, de Tennessee Williams.[11] Assumpta Serna (Matador (filme)) tem um papel cameo sem fala;[10] Almodóvar aparece como o anfitrião do concurso Ereções Gerais. ProduçãoFoi o primeiro longa-metragem de Almodóvar. Anteriormente, ele havia feito apenas curta-metragens em super-8, Salome (um curta-metragem em dezesseis milímetros) e Folle, folle, fólleme, Tim (1978), um longa-metragem em super-8. Nenhum dos filmes tinha trilha sonora.[11] O embrião do filme foi uma história escrita por Almodóvar intitulada "Ereções Gerais", publicada na revista "A víbora" em 1978. O título era uma paródia das eleições gerais de 1977 na Espanha.[11] A ideia de transformar a história num filme surgiu de sua colaboração com o grupo teatral Los Goliardos.[6] Atuando num pequeno papel na peça "Mãos Sujas", de Jean-Paul Sartre, Almodóvar se encontrou com Carmen Maura e Félix Rotaeta, que o encorajaram a transformar a história num filme.[6] Almodóvar reescreveu a história e alterou seu título para Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón ("Pepi, Luci, Bom e outras garotas do grupo").[10] O orçamento inicial era de apenas 500 000 pesetas, que Carmen Maura e Félix Rotaeta ajudaram a arrecadar.[6] Nessa época, Almodóvar trabalhava na Telefónica, a companhia nacional de telefone da Espanha, como um empregado administrativo. Portanto, o filme teve de ser rodados aos finais de semana, com um grupo de voluntários.[9] Sem o apoio de um estúdio, Almodóvar teve de fazer muitas filmagens em ambientes reais. A real residência dos pintores gueis Costus (Juan Carrero e Enrique Naya), que aparecem no filme, serviu de locação para a casa onde vão morar Luci e Bom.[12] A filmagem foi caótica; começou em 1978 e durou um ano e meio. Devido aos problemas financeiros, foi necessário um ano inteiro para produzir apenas cinquenta minutos de filme.[11] Isso era uma duração insuficiente para a distribuição comercial.[6] Foi necessário mais dinheiro. Com apoio de Pepón Coromina, um produtor catalão, foi possível filmar mais trinta minutos, filmados ao longo dos seis meses seguintes em 1980.[11][6] O filme foi adaptado dos dezesseis milímetros iniciais para o formato de 35 milímetros, de modo a possibilitar seu lançamento nos cinemas. A equipe de produção não tinha experiência e o câmera cortou algumas cabeças, especialmente na cena do concurso Ereções Gerais. A filmagem longa e caótica gerou problemas de continuidade. Quando a filmagem começou, Olvido Gara tinha quinze anos. Quando a filmagem terminou, ela tinha dezessete anos.[6] A primeira cena, quando Pepi vai abrir a porta a um policial, foi filmada em junho de 1979, mas a cena com Pepi falando com o policial só foi filmada em dezembro de 1979, e a cena com os dois se sentando para conversar só foi filmada em junho de 1980.[6] RecepçãoO filme estreou em 19 de setembro de 1980 no Festival Internacional de Cinema de San Sebastián, na seção dedicada a novos diretores.[13][6] Posteriormente, percorreu o circuito independente e foi exibido durante quatro anos, tarde da noite, no teatro Alphaville, em Madri. As críticas na Espanha foram principalmente negativas, questionando a frivolidade e o humor vulgar do filme.[14] Pedro Crespo, no jornal conservador ABC, descreveu o filme como "apenas uma variação da velha tradição da comédia vulgar, adaptada à linguagem contemporânea".[15] Diego Galán, do jornal El País, exaltou o filme, concluindo que "estamos em presença de um estonteante e até agora único trabalho. Almodóvar fez seu primeiro longa-metragem profissional e, ao fazê-lo, minou os mais respeitáveis tabus de nossa tola sociedade".[15] O jornal El Periódico de Catalunya descreveu Almodóvar como "um teimoso defensor dos filmes de baixo padrão".[16] O filme foi lançado nos Estados Unidos em 1992, somente depois que Almodóvar se tornou famoso. A reação dos críticos estadunidenses foi, de modo geral, hostil. O filme foi criticado por sua inconsistência formal e temática. Janet Maslin, no The New York Times, considerou-o "uma comédia grosseira e sem graça, notável por seu humor negro, sua bem-humorada cena de estupro e sua abismal cinematografia de cinema caseiro." Ela acho "seu humor de um tipo bem adolescente... e reviravoltas na trama que são melhor descritas que vistas".[16] A crítica Rita Kempley, do The Washington Post, o considerou uma "estreia amadora de diretor, uma obscena apresentação sexual secundária, a ser vista preferencialmente com um preservativo sexual sobre o corpo inteiro". O filme custou 6 000 000 de pesetas (aproximadamente 36 000 euros) e arrecadou 43 000 000 de pesetas (260 000 euros) no seu lançamento inicial em Madri.[17] Com seus vários elementos kitsch, estilo camp, humor agressivo e sexualidade livre, o filme se tornou emblemático da movida madrilenha. Se tornou cult e rendeu, a seu diretor, a reputação de agente provocador.[15] TemaO tema central do filme - resiliência, independência e solidariedade femininas - seria uma constante na carreira de Almodóvar, embora fosse melhor retratado nos seus posteriores e mais complexos filmes. Assim como os personagens femininos de Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, Tudo sobre Minha Mãe e Volver, Pepi e Bom são autossuficientes, independentes e sua amizade é retratada como sendo mais importante que qualquer envolvimento amoroso ou sexual.[18] Em contraste, os homens ou não existem ou são apresentados de modo antipático, como o policial de Pepi, Luci..., o abusivo marido de Raimunda em Volver ou o amante infiel de Pepa em "Mulheres..." Embora Bom e Luci formem um casal homossexual, sua história é menos importante que sua amizade. Enquanto a amizade entre as duas continua forte, o relacionamento amoroso entre as duas acaba quando Luci retorna ao relacionamento heterossexual abusivo com seu marido. Duas cenas colocam a proximidade entre Pepi e Bom em primeiro plano. Em contraste com o problemático lar de Luci, Pepi é apresentada cozinhando o prato favorito de Luci: bacalhau ao pil pil.[19] Apropriadamente, o filme encerra com as duas amigas contemplando a perspectiva de um futuro como colegas de quarto, com as duas se apoiando uma à outra. O filme também aborda outros temas frequentes na carreira de Almodóvar: heterodoxia sexual, drogadição e amor pela cultura pop. GêneroEntre os demais filmes de Almodóvar, Pepi, Luci... é o que assume de modo mais explícito o gênero de comédia. Todos os demais (com a possível exceção de Los amantes pasajeros) incorporam elementos de melodrama. Os personagens são mostrados como arquétipos cômicos. Pepi é a inteligente e independente mulher moderna. O policial radical nojento está lá. Bom é mostrada como a adolescente rebelde e perversa e Luci é a dona de casa que sofre abuso.[20] A apresentação amadora do filme e seu humor cru também o situam à parte do resto da filmografia de Almodóvar. Até mesmo em "Labirinto de Paixões", seu filme seguinte, os elementos cômicos não são apresentados de modo tão explícito. Nesse segundo filme, a estrutura do roteiro e a técnica de filmagem se apresentaram mais desenvolvidas.[21] AnáliseA origem do filme a partir das histórias em quadrinhos fica evidente em sua estrutura solta, vulgaridade provocativa e intertítulos feitos por um famoso ilustrador espanhol, Ceesepe, então um desconhecido membro da movida madrilenha. O filme foi assolado por problemas técnicos e financeiros; Almodóvar clamou, de forma bem-humorada, que "quando um filme tem um ou dois, é considerado um filme imperfeito, mas, se há uma profusão de falhas técnicas, isso é chamado estilo. Brinquei sobre isso quando estava promovendo o filme, mas isso estava muito próximo da realidade".[22] Estilisticamente, o filme deve aos primeiros filmes de Paul Morrissey e, sobretudo, a Pink Flamingos, de John Waters.[23] Almodóvar confronta o espectador com situações ultrajantes, incluindo uma cena com chuva dourada lésbica no meio de uma aula de costura.[24] Os defeitos técnicos e de roteiro do filme são evidentes, especialmente quando comparados com os melhor acabados e complexos filmes posteriores de Almodóvar. Entretanto, o filme capturou o espírito de sua época, a movida madrilenha, apresentando Madri como uma cidade excitante onde tudo é permitido.[25] O filme é centrado na cultura jovem, mostrando-a como selvagem, frívola, aventureira e livre de tabus.[26][27] Existe um simbolismo político na postura direitista e machista do policial, que representa a sociedade franquista que desaparece. Ele é apresentado de forma antipática.[28] Pepi e Bom representam a moderna mulher espanhola, a nova e selvagem face de uma Espanha democrática e livre. Luci é a dona de casa espanhola que se autossacrifica, presa entre a velha e a nova Espanha. É a masoquista que anseia pela brutalidade do passado. Confundindo os limites da identidade sexual, os personagens transexuais aparecem em muitos filmes de Almodóvar.[29] No filme, há uma drag queen chamada Roxy, interpretada por Fabio McNamara, que é a parceira de canto de Almodóvar numa paródia de duo de glam rock. Os elementos cômicos do filme desafiam o bom gosto e são apresentados sem rodeios.[30] Almodóvar não enfatiza a estranheza da relação sexual entre uma dona de casa em seus quarenta anos e uma punk rebelde adolescente, que é apresentada como se fosse algo normal. É, claramente, um filme amador; como obra de estreia, Almodóvar foi aprendendo seu ofício conforme rodava o filme.[31][32] Trilha sonoraO filme abre com a canção Do the swim, interpretada por Little Nell, coprotagonista do filme cult de 1975 The Rocky Horror Picture Show.[33] A canção da contracultura Murciana marrana, escrita por Fabio McNamara, é apresentada com destaque, interpretada por Alaska e os Pegamoides com uma mistura de vulgaridade e absurdo.[34] O filme encerra com a canção latino-americana Estaba escrito, interpretada por Monna Bell, uma cantora chilena.[35] Referências
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