Ofensiva de Fezã em 2019
Ofensiva do Fezã ocorre durante a Segunda Guerra Civil Líbia, sendo iniciada em 16 de janeiro de 2019 com uma ofensiva militar do Exército Nacional Líbio para assumir o controle do sudoeste da Líbia. ContextoO sul da Líbia é uma área onde as relações intercomunitárias são frágeis.[1][3] Sobretudo, são notáveis os combates entre os tuaregues e os tubus em Ubari entre 2014 e 2015 e entre os tubus e os árabes da tribo de Oulad Souleymane em Saba em 2017.[1] Também são relatados muitos casos de sequestro por resgate, roubo e banditismo.[1][3] Vários grupos rebeldes sudaneses, chadianos e nigerinos estão presentes no sul da Líbia, particularmente na região de Saba.[1][3][4] Forças envolvidas
Cerca de cinco ou seis grupos rebeldes chadianos usam o sul da Líbia como base de retaguarda.[2][5] O mais importante é o Conselho do Comando Militar para a Salvação da República (CCMSR), seguido pela União das Forças da Resistência (UFR), pela Frente pela Alternância e Concórdia no Chade (FACT) e pela União das Forças para a Democracia e o Desenvolvimento (UFDD).[2][6] No total, essas milícias chadianas reúnem vários milhares de combatentes: seu número é estimado entre 2.000 e 3.500 pela ONU no início de 2018[1], entre 4.000 e 11.000 segundo Alexander Bish, pesquisador da "Global Initiative", no início de 2019[2] e 18.000 de acordo com o Governo de União Nacional em 2017.[5] Esses grupos são próximos das Brigadas de Misurata e, em particular, da Terceira Força.[1] Em 2017, participam nomeadamente ao lado destes na ofensiva do Crescente Petrolífero e na Batalha de Biraque.[1] No entanto, na primavera de 2017, enfraquecida pelos contra-ataques do Exército Nacional Líbio, a Terceira Força retira-se de Fezã.[1] Os grupos chadianos encontram-se isolados e alguns tentam conciliar-se com o Marechal Haftar.[1] A Frente pela Alternância e Concórdia no Chade (FACT) obtém assim a autorização para permanecer em Jufra, com a condição de manter-se ordeira.[1] Outras formações sobrevivem envolvendo-se em redes de contrabando.[1] O Chade igualmente acusa o Catar de financiar os rebeldes chadianos.[5] Os rebeldes sudaneses encontram-se aglutinados no Reagrupamento das Forças para a Libertação do Sudão, surgido em junho de 2017 e liderado por Taher Abu Bakr Hajar.[7] Esta aliança inclui três grupos armados de Darfur: o Movimento pela Justiça e Igualdade (MJI) e as duas facções do Exército de Libertação do Sudão, uma liderada por Abdul Wahid al-Nour e a outra por Minni Minnawi.[7] Os rebeldes sudaneses, apoiados pelo Chade, servem como mercenários nas forças de Haftar.[7][1] O Reagrupamento das Forças para a Libertação do Sudão dispõe de uma base militar em Cufra, que conta com 2.000 combatentes armados.[7] No sudoeste, os territórios tuaregues são controlados pelo Conselho Supremo dos Tuaregues da Líbia, liderados por Moulay Ag Didi.[8] Os tuaregues controlam diversos poços de petróleo e, de 2014 a 2015, entraram em um confronto violento com os tubus, na região de Ubari, até a conclusão de um acordo de paz assinado com a mediação do Catar.[8] Desde 2016, o Conselho Supremo dos Tuaregues apóia o Governo de Unidade Nacional de Fayez al-Sarraj.[9]. O Exército Nacional Líbio do Marechal Khalifa Haftar dispõe de uma presença limitada no Fezã.[1] No entanto, obteve o reforço da Brigada Khalid Ibn Walid, dirigida por um salafita tubu.[1] PrelúdioEm fevereiro de 2018, novos combates irrompem em Saba entre a tribo árabe Oulad Souleymane e os tubus, sendo a primeira próxima ao Governo de Unidade Nacional liderado por Fayez el-Sarraj e os segundos próximos de Khalifa Haftar.[10][11][12][13] Posteriormente, no entanto, uma grande parte da tribo Oulad Souleymane se juntou a Haftar.[14] No final de maio de 2018, a Líbia, o Chade, o Níger e o Sudão assinam um acordo de cooperação em segurança, que autoriza o "direito de perseguição".[1] Em 13 de outubro de 2018, a aviação do Exército Nacional Líbio bombardeou um grupo chadiano em Fezã, perto de Tamassah, matando o líder rebelde Mohamed Kheir.[1] [15] Em seguida, combates esporádicos aconteceram perto do oásis de Tamassah.[15] Em 16 de outubro, Khalifa Haftar vai a N'Djamena para se reunir com o presidente do Chade, Idriss Déby.[1][3] Os dois homens convergem sobre a necessidade de uma operação no sul da Líbia, o que permitiria a Idriss Déby se livrar dos grupos rebeldes e Haftar, já senhor do leste do país, assumir o controle do sul.[1][3] Israel também teria respondido favoravelmente ao pedido do presidente do país, Idriss Deby, feito em novembro de 2018 durante a visita oficial de Benyamin Netanyahu, para ajudar a proteger a fronteira norte do Chade com a Líbia.[16] DesenvolvimentoEm 16 de janeiro de 2019, o Exército Nacional Líbio anuncia o início de sua ofensiva.[17][16][18] A operação é feita em coordenação com o governo do Chade e com o apoio da França, mas é vista com preocupação pela Argélia.[16][14] Os Estados Unidos não reagem.[19] A ofensiva é lançada a partir da base aérea militar de Tamenhant, a cerca de trinta quilômetros ao norte de Saba, a maior cidade do sul da Líbia. No entanto, as unidades do Exército Nacional Líbio já haviam assumido posições em torno de Saba nos dias anteriores. O Exército Nacional Líbio então afirma através de seu porta-voz, Ahmad al-Mesmari Mesmari, querer "garantir a segurança dos habitantes do sudoeste contra os terroristas, seja do Daexe ou da al-Qaeda, bem como dos bandos criminosos". Também alega almejar proteger os locais de petróleo, bem como as estradas que ligam o sul ao norte e lutar contra a imigração ilegal. Em um comunicado, apela às milícias locais para evacuar os locais militares que ocupam.[17] No final de janeiro, o Exército Nacional Líbio assegura sem muita dificuldade a cidade de Saba.[20][16][21] O Exército Nacional Líbio anuncia a tomada de Saba em 19 de janeiro, mas efetivamente não assume o controle de algumas partes da cidade até o dia 24.[22] Em 27 de janeiro, o Exército Nacional Líbio reivindicou a captura da região de Godua, a oitenta quilômetros ao sul de Saba.[22][16] No dia 1 de fevereiro, ao amanhecer, os rebeldes chadianos tentam atacar Godua.[16] Pelo menos três homens do Exército Nacional Líbio são mortos, incluindo dois oficiais.[16] As forças de Haftar também cercam a cidade de Murzuque, mantida pelos tubus.[21] A operação é ressentida pelas populações tubus que habitam na região: a Assembleia Nacional dos Tubus condena a ofensiva e os deputados líbios tubus suspendem sua participação na Câmara dos Representantes de Tobruque.[18] A Assembleia Nacional dos Tubus também condena a operação exigindo explicações sobre as declarações do porta-voz do Exército Nacional Líbio, que acusou a tribo de "conluio com as forças estrangeiras".[18] Anteriormente aliados Haftar, os tubus então aparentam estarem divididos.[18] Em 18 de janeiro de 2019, o Exército Nacional Líbio anunciou que havia matado Abu Talha al-Libi, um líder da al-Qaeda no Magrebe Islâmico.[23][24] Abu Talha al-Libi teria sido morto junto com outros dois jihadistas — o líbio el-Mehdi Dengo e o egípcio Abdallah Desouki — durante uma incursão contra duas casas na região de al-Qarda al-Chatti, a cerca de sessenta quilômetros a nordeste da cidade de Saba.[23][24] Em 3 de fevereiro, 121 rebeldes tubus nigerinos do Movimento pela Justiça e Reabilitação do Níger (MJRN), liderados por Mahamat Tinaymi, abandonaram a Líbia e se renderam ao exército nigerino em Madama.[25] Uma cerimônia de desarmamento acontece em Dirkou no dia 11 de fevereiro.[26] Com base no sul de Murzuque, os rebeldes chadianos da União das Forças da Resistência também preferem deixar o sul da Líbia ao invés de lutar contra as tropas de Haftar.[21][2] Assim regressam ao território chadiano, mas entre 3 e 6 de fevereiro sua coluna é alvejada pela força aérea francesa no deserto de Ennedi.[21] Cerca de vinte dos seus veículos são destruídos e entre 100 e 250 combatentes rendem-se às forças do governo chadiano.[21][27] Em 6 de fevereiro, o Exército Nacional Líbio anuncia ter apreendido o campo petrolífero de al-Sharara (perto de Ubari); o maior do país, gerando sozinho um terço da produção líbia, fechado desde 10 de dezembro e anteriormente controlado por milicianos tuaregues.[14][18][19] Esta tomada ocorre apenas algumas horas antes de o Governo de Unidade Nacional anunciar o envio dos Guardas das Instalações Petrolíferas para al-Sharara.[18] Os tuaregues encontram-se então divididos e vários dos seus batalhões se juntam ao Exército Nacional Líbio.[14][19] O Governo de Unidade Nacional permanece várias semanas sem reagir.[18] As forças do Exército Nacional Líbio são bem acolhidas pela população[19] e, de acordo com o Le Monde, "a maioria dos observadores concorda em atribuir os recentes avanços de Haftar na região estratégica de Saba ao desencanto geral dos habitantes em relação às autoridades centrais de Trípoli".[14] Em 6 de fevereiro, o Conselho Presidencial do Governo de Unidade Nacional emitiu um comunicado afirmando que "a guerra contra o terrorismo deveria ser feita por meio da coordenação entre o aparato de segurança do Estado e não por operações apressadas".[18] No mesmo dia, para conter o progresso de Haftar, Fayez el-Sarraj nomeou o tuaregue Ali Kana, um ex-militar khadafista, como comandante da "zona militar sul".[14][21][18] Ghassan Salamé, enviado das Nações Unidas para a Líbia, manifesta preocupação com o "risco de escalada da violência".[18] Em 13 de fevereiro, segundo o Governo de Unidade Nacional, um ataque aéreo é conduzido perto de Ubari pela aviação estadunidense contra a al-Qaeda.[19] No entanto, os Estados Unidos desmentem no dia seguinte ter realizado um raide na Líbia.[28]. Na manhã de 20 de fevereiro, o Exército Nacional Líbio entra na cidade de Murzuque e inicia combates contra os rebeldes chadianos.[29][30][31] O Exército Nacional Líbio reivindica a captura da cidade durante o dia indicando, contudo, que "as unidades de combate continuarão [...] perseguindo o restante dos mercenários da oposição chadiana presentes na cidade".[22] À noite, o general tubu Ibrahim Mohamad Kari, chefe de segurança nesta cidade, é assassinado por um "grupo armado fora da lei" de acordo com um comunicado do Ministério do Interior do Governo de Unidade Nacional.[30][31] Em 21 de fevereiro, o Exército Nacional Líbio anuncia ter capturado "pacificamente" o campo petrolífero de al-Fil.[32] [31] ConsequênciasPara Jalel Harchaoui, especialista em Líbia e pesquisador do Instituto Clingendael: "Em um mês, Haftar virou tudo de cabeça para baixo, o processo político foi passado para o segundo plano. O marechal pretende mostrar, tanto para os líbios quanto para os seus patrocinadores externos, que ele está realizando uma atuação militar sem falhas e continua seu avanço em direção a Trípoli, apostando em sua legitimidade militar para encorajar adesões. Se for bem sucedido, Haftar poderá se estabelecer em Tripoli antes mesmo da realização de uma conferência nacional e da organização de eleições presidenciais e legislativas".[19] Referências
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