Sílvio Romero inicia suas Cartas combatendo o presidencialismo em suas origens, isto é, nos Estados Unidos da América, grande fonte de inspiração dos republicanos brasileiros e da Constituição de 1891[4]. Segundo Romero:
Uma critica mais segura das fontes e das condições que deram origem à Constituição americana tem esclarecido a verdadeira índole do chamado presidencialismo, que, bem longe de ser o grande mérito daquela organização política, é, ao contrario, o seu maior defeito. [...] Além de que o genuíno parlamentarismo não tinha ainda naquele tempo chegado à completa elaboração de sua própria fórmula e, isto é capital, acresce que os legisladores americanos, mesmo para o que já então existia na Inglaterra, não beberam nas melhores fontes.
Defesa do parlamentarismo
Sílvio Romero então inicia sua defesa do parlamentarismo, recorrendo aos exemplos europeus[4]. Segundo o polímata:
[...] ao passo que os americanos transportavam para a União uma anomalia própria dos governos locais das colônias, o parlamentarismo seguia a sua evolução para adiante; dotava a Grã-Bretanha do governo mais livre que existe sobre a terra, ia ter repercussão entre os povos progressivos e liberais. A Holanda, a Bélgica, a Suécia, a Itália, a França, a Espanha, entraram no grande ciclo dos governos de discussão, de responsabilidade, de vida ás claras, governos da opinião.
Em seguida, ele rebate as críticas ao parlamentarismo do Império, alertando que a Constituição de 1824 não previa tal sistema, mas que, ainda assim, ele se desenvolveu entre nós ao longo das décadas, apelando para a tradição política brasileira dos últimos 70 anos[4]:
Como quer que seja, porém, e isto é o principal, o parlamentarismo entre nós tinha já a seu favor a experiência de 70 anos de vida, que se pôde dizer normal.
Por fim, Sílvio Romero defende a possibilidade de convivência entre o parlamentarismo e o federalismo, sistema administrativo caro a praticamente todos os republicanos brasileiros[4]. Segundo o autor:
Como poderá um ministro responder por fatos passados nos Estados, que são autônomos? A resposta é muito simples: deverá responder pelos fatos passados nos Estados que forem da competência do governo federal; e os membros do Congresso deverão ter o bom senso e o critério indispensáveis para não responsabilizarem uma autoridade por coisas, que não são da sua alçada. [...] em sua fisionomia geral, o Império Inglês é uma verdadeira federação, mais de um Estado que o compõe acha-se em idênticas condições; o mesmo Canadá e a Austrália estão no caso; fazem parte de uma federação e cada um deles é por sua vez uma federação, e regida parlamentarmente.
Nesse sentido, o intelectual mantém sua argumentação em defesa da possibilidade de harmonia entre federalismo e parlamentarismo, indicando um verdadeiro receituário político-administrativo a Ruy Barbosa, baseado na experiência da Terceira República Francesa[4]. As medidas indicadas para essa harmonia são:
Unidade da magistratura, como garantia de independência, diante das lutas locais.
Determinação de um máximo à representação dos estados grandes e fortes, para que não sufoquem as justas aspirações dos pequenos;
Exigência de dois terços dos votos da Câmara dos Deputados para a retirada de um ministério, no intuito de coibir as surpresas de votação e as precipitações da maioria;
Constituir o Senado o regulador da dissolução da Câmara, no empenho de refrear o arbítrio do chefe do Executivo;
Convicção absoluta de que grande parte das questões de gabinete, elevadas à altura de conflitos políticos, não passam de simples problemas administrativos, solúveis pacificamente;
Eleição do Presidente da República pelo Congresso Nacional, como na França da época, ou por um eleitorado especial, selecionado, em condições de independência;
Bom senso dos deputados para não responsabilizarem os ministros por fatos que não são de sua competência.
Bibliografia
ROMERO, Sílvio. Parlamentarismo e presidencialismo na República brasileira: cartas ao Conselheiro Ruy Barbosa. Rio de Janeiro: Companhia Impressora, 1893, pp. 7; 10; 99; 122; 149-151.